domingo, 29 de novembro de 2009

Pronto, acabou!

Terminei a sexta-feira, 27/11, às 22:30 e não às 23:00, como deveria ser, porque a direção achou por bem que os alunos já tinham assistido muitas aulas durante a semana. Não contabilizei o quórum das demais salas mas, a minha, como sempre (e exceto quando resolvem faltar coletivamente, como na semana passada) estava cheia. Mas, seja lá como for, acabou. Daqui para frente são só "dias letivos".

Agora a coordenação aguarda ansiosa as médias finais para o início da semana que vem porque a secretaria da escola não têm muito tempo e nem funcionários para digitar as notas na "Prodesp" (Prodesp = órgão místico ao qual aludem os funcionários da secretaria sempre que querem se desculpar de alguma coisa não feita ou quando querem que façamos algo "fora do padrão" para adiantar o serviço deles). Há meses temos uma plaquinha que passa grande parte do tempo pendurada na janelinha fechada da secretaria com os dizeres "Não estamos atendendo por falta de funcionários". Se a idéia pega logo logo teremos uma na porta da sala de aula dizendo "Não estamos ensinando por falta de salários" ou, outra em outra porta dizendo "Não estamos governando por excesso de otários". Enfim, as placas sempre indicam os caminhos e dão boas rimas.

Tenho que fechar minhas notas com cinco semanas de aulas (desde que voltei), das quais perdemos pelo menos uma semana inteira entre feriados, saresps, excursões (de meia dúzia de alunos vão, mas param a escola toda) e "dispensas", como essas das sextas-feiras à noite. O fato é que em algumas salas eu pude dar umas três ou quatro aulas, em outras, cinco ou seis aulas, mas em nenhuma consegui dar as 10 aulas que "teoricamente" aconteceram nesse período e nem em sonho poderei dar as aulas das próximas semanas. Não participei de nenhuma reposição aos sábados e com isso perdi duas missas, uma caminhada e a oportunidade de pintar portões (aula mesmo não existe aos sábados), além de ter "faltas" computadas em meu nome como se eu realmente trabalhasse aos sábados para o Estado.

Infelizmente os meus subsitutos no período em que eu estava afastado não deixaram avaliações para compor com as minhas e isso quer dizer que devo espremer a nota dos meus alunos com base apenas nessas poucas aulas. Aliás, um dos substitutos não deixou nem mesmo as cadernetas das classes onde me substituiu. É isso mesmo, o sujeito levou as cadernetas embora e não as devolveu! E só faz cinco semanas! É no mínimo impressionante.

Na semana que vem teremos apenas alguns alunos perdidos na escola em busca de "notas" e outros que vêm para bater papo. É claro que a escola também promoverá eventos esportivos e culturais que substituirão as aulas tradicionais e que, em um outro contexto, podem até ser boas oportunidades de aprendizagem para os alunos, mas ao fim e ao cabo o que todos parecem querer é apenas que as cortinas baixem e todos possam tirar suas máscaras em paz.

Li nos jornais (e se não fosse nos jornais eu não teria acreditado de tão estapafurdia que é a notícia) que o sindicato da categoria pretende fazer greve em fevereiro... Só se for greve de fome, né? Ainda bem que tudo termina bem e nada "dá nada não".

domingo, 22 de novembro de 2009

A escola que acordou inseto

Semana de Saresp em pleno novembro é palco para todo tipo de festa. Mas a festa aqui já começou bem antes, em plena sexta-feira, 13/11, quando fui convidado a "subir uma aula" para um terceiro ano do noturno porque a classe não tinha professor e eu tinha as duas últimas aulas lá. Subi, e na hora do intervalo a classe foi dispensada pela direção porque seria a única sala a continuar tendo aula após o intervalo (onde já se viu apenas uma classe ser penalizada com aula!).

Na terça-feira "fiquei cumprindo horário à noite" porque os terceiros anos estavam fazendo Saresp. Já na quarta-feira, 18/11, fui solicitado para "dar aula em uma sala onde não leciono" no período da manhã por falta de professor e de eventual. Na quinta fiquei novamente duas aulas de bobeira no período da manhã, enquanto os terceiros faziam a prova do Saresp.

Aliás, "fazer prova do Saresp" é uma metonímia tresloucada para "vamu imbora pessoar!". Nenhum aluno leva essa p... prova a sério. Prova que, segundo os próprios alunos, "não serve para nada" e "só tem coisa que a gente nunca viu". De fato, o Saresp sempre foi, e esse ano também, uma prova conteudista, descontextualizada e que avalia conteúdos curriculares independentemente das realidades escolares locais; o que, traduzido para o bom português, significa: "prova que avalia o que o aluno deveria saber se ele estivesse em uma escola de verdade". Razão pela qual os resultados que ela estampa são tão ruins quanto parecem.

Na sexta de manhã participei de altas negociações com os colegas do corpo docente para que eles pudessem completar os seus projetos, que exigia que os alunos participassem assistindo a uma peça de teatro, ou encenando-a, e para que eu pudesse "dar aula normalmente" para um segundo ano que quase não teve aula comigo desde que retornei de minha licença há um mês. E para fechar a sexta-feira, o terceiro ano do noturno que foi dispensado de uma aula minha na sexta-feira da semana passada (para não ser a única classe com aula na escola) resolveu dar o troco e faltar coletivamente, fazendo companhia para o resto da escola. Isso sim que é "equidade em seu maior e melhor estilo pedagógico".

Por fim, no sábado, a "reposição" foi marcada na igreja católica do bairro. É isso mesmo, vão à missa repor aulas. Infelizmente vão colocar "ausência total" na frente do meu nome no livro-ponto porque estou me recusando a participar dessa farsa chamada "reposição" desde que foi proposta, mas se eu não quisesse participar de uma missa católica (essa história de escola laica é só mais uma grande mentira) teria como alternativa ficar fazendo reparos na escola (dia de pintar o portão!). E porque não... Afinal, sou só um professor mesmo!

É engraçado como lendo tudo isso que eu relato aqui, eu mesmo me sinto como Josef K., aquele sujeito protagonista de "A Metamorfose", de Kafka. Imagino então o que os meus oito leitores não devem pensar. A "escola pública" (pelo menos "essa onde estou") é tão surreal que o mais psicodélico porra-louca dos idos de sessenta se sentiria "mó careta" se vivenciasse o que descrevo.

Curioso mesmo é ler os papers dos especialistas que tentam desvendar os mistérios da barata-pedagógica brasileira que nem Kafka seria capaz de imaginar. Também é curioso saber que esses especialistas recebem salários para isso há décadas, enquanto a escola só piora e barateia. Seriam eles insetos também?

terça-feira, 17 de novembro de 2009

A era do "Não tô nem aí"

Este post baseia-se no original que eu publiquei diretamente na seção de notícias no meu portal.

Nessa segunda-feira acabou o prazo de votação no concurso "Experiencia nota 10" do site NET Educação, onde eu havia inscrito um dos projetos que desenvolvi no ano passado.

Perdemos feio! Mas aprendemos algo com isso.

Embora o concurso não tenha analisado os projetos, apenas os colocou em votação para o público, eu cheguei mesmo a pensar que teríamos alguma chance de ganhar, pois parte do prêmio era um datashow para a escola e para votar no projeto não custava nada, bastando acessar o site do concurso e votar. A única exigência era fazer antes um breve cadastro rápido e gratuito e depois de votar confirmar o CPF (o que exige do votante que ele tenha CPF e "elimina" a possibilidade de muitos estudantes que não têm CPF votarem).

Eu divulguei o projeto na Internet, no meu site, no meu blog e em várias listas, fóruns e grupos de discussão dos quais participo. Além disso, avisei todos os meus alunos e coloquei nos corredores da escola diversos cartazes falando sobre o concurso, o prêmio, como votar e como acessar o site. Também comuniquei a gestão da escola, a coordenação, a secretaria e os colegas professores.

Bom, noves fora nada, o resultado foi que o meu projeto teve 24 votos e o projeto ganhador teve 884. Parabéns ao vencedor! E, diga-se de passagem, o projeto vencedor é um belo projeto mesmo.

Resta então apenas uma breve reflexão sobre a origem desses 24 votos... De onde terão vindo?

Entre meus amigos virtuais que disseram ter votado no meu projeto já dá para somar quase esse número. Na minha escola, entre professores, gestão e funcionários da secretaria, passamos tranquilamente desse número e, finalmente, entre meus alunos com CPF, e sem contar os demais alunos da escola para os quais não leciono, certamente teríamos muitos votos possíveis. Considerando ainda que divulguei o projeto na Internet para um público estimado de cerca de 30.000 pessoas da área de Educação, o retorno em votos foi algo como 0,001%. Nada mal!

Por fim, tomando-se em conta que o projeto era realmente bom, a causa era justa e o custo de votar nele era nulo, acho que só resta uma boa explicação para essa absoluta falta de votos: ninguém se importa. Simples assim.

Mas porque será que ninguém se importa se a grande maioria, incluindo aí os "amigos engajados", os professores e gestores da escola e, principalmente, seus alunos, vira e mexe pousam de defensores da educação, amigos da escola, etc.?

Eu vi também os resultados dos demais projetos e, com exceção do projeto ganhador e de um segundo projeto, também bastante votado, todos os demais naufragaram em cifras semelhantes ou piores que esses fatídicos 24 votos. Porque?

É compreensível que o Fulano de Tal que mora lá longe e nunca ouviu falar do autor, do projeto ou da escola, possa escolher o projeto em que votar pelo seu "gosto", mas o que dizer dos alunos, pais, professores e gestores da própria escola que concorria com o projeto?

Porque as pessoas que deveriam se importar, não se importam? Onde erramos como sociedade, como comunidade e como grupo? Ou será que a época é mesmo "a era do não tô nem aí"?

sábado, 14 de novembro de 2009

Sem tempo, sem tempo, sem tempo...

Está difícil até arrumar tempo para fofocar nesse meu blog. E o pior é que razões para fofoca não faltam. Mas todo ano é assim mesmo, nos meses finais tem sempre muita correria, muita afobação e o mesmo destino de todos os outros anos: lugar nenhum.

Nessa época já estamos pensando em fechar as notas até o final de novembro. Claro, as aulas vão até a véspera do Natal (aulas não, "dias letivos" - Santa Enganação, Batman!), mas as notas têm que estar na secretaria até o final do mês e os alunos, que são tão espertos quanto os políticos eleitos por seus pais, também sabem que depois do final de novembro só restam "dias letivos" e que faltar à escola nessa época "não dá nada não".

Nesta semana tivemos de tudo na escola. Já na terça-feira, em pleno início da quarta-aula, o apagão misterioso que pifou meu datashow e me deixou literalmente na era do "Professor Giz & Tal". Tudo bem, também sei ser professor "tecnologicamente prejudicado". Depois tivemos uma sexta-feira "emendada", consequencia do apagão educacional causado por uma excursão ao Hopi Hari que ocorre todo ano e sempre é a mesma coisa: meia dúzia de pica-paus vão brincar no parque e outros 500 matam as aulas. Mas como "não dá nada não"...

O resumo da história foi que aproveitei a sexta de manhã para buscar os datashows pifados na assistência e  para tentar recuperar um notebook desconfigurado da escola (e ainda não consegui reconfigurar o coitado - ainda bem que vem SARESP aí pela frente) e à noite, quando eu só tinha duas aulas, dei uma delas até antes do intervalo e depois a classe foi dispensada, porque se não fosse seria um absurdo 30 alunos assistindo aula de física sozinhos em uma sexta-feira à noite e o resto da escola literalmente "apagada". Será que seria um absurdo mesmo? Ou não terá sido absurdo tê-los mandado embora? Pausa para para um momento de reflexão pedagógica...

Ainda preciso confirmar com os alunos a data da palestra sobre o exame do ENEM, mas acho que estou me preocupando à toa. Os alunos dos terceiros colegiais, que deveriam ser os maiores interessados, parecem que não estão nem aí com o exame. Apesar de todos os esforços ao longo de todos esses anos, a pressão que eles recebem do "meio" é sempre maior e na cabecinha da maioria deles ainda sobrevive a idéia Aristotélica do "lugar natural de cada coisa"; a maioria ainda acredita que universidade, e principalmente se for pública e de boa qualidade, é lugar natural para ricos ou nerdes debilóides, e que o lugar deles é mesmo na sala, assistindo novela ou futebol.

Semana que vem tem SARESP e, portanto, também não tem aula nos terceiros anos (e tome dia letivo!).  Acho que teremos alunos nas outras séries (que não fazem o SARESP), mas como "não dá nada não..." talvez alguns resolvam decretar férias antecipadas também nessa semana. Enquanto isso... Em algumas salinhas fechadas, com cafezinho free e ar condicionado, pensadores refinados e altamente graduados fazem profundas reflexões pedagógicas sobre as causas do fracasso escolar... E, claro, vão concluir o de sempre. Afinal, para eles também "não dá nada não".

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

O apagão que apagou o datashow

Lá estava eu tentando ganhar tempo no curso de Física de Partículas para os alunos do 3C noturno quando... Zip! É, zip mesmo. A luz apagou, acendeu, apagou de novo, acendeu de novo e parece que os fantasmas haviam levantado das tumbas para aterrorizar a escola. Na verdade era só o "apagão" de ontem à noite (10/11/2009) que derrubou Itaipu e causou um blackout em várias regiões do país.

Obviamente no primeiro piscar de luz uma mocinha já gritou "Acabou a aula! 'Dispensa nóis', pssor!", e antes de eu dizer qualquer coisa a luz já estava de volta e firme. Para a tristeza da donzela a luz continuou firme e forte até as 23:00. :)

O problema é que enquanto acontecia o "zip", o nosso datashow fazia "zap" e daí por diante se recusaria a ligar novamente. Tenho uma vaga esperança de que seja apenas um fusível queimado, já que o outro datashow pifou na semana passada e, nesse caso, foi de "velhice" mesmo.

Com Data ou sem Data, o Show não pode parar, então vamos nós lá para lousa e bola para frente. Ou melhor, "partículas, adiante!".

Por uma grande coincidência, duas semanas antes eu havia inscrito um projeto meu de uso pedagógico das TICs na Educação no concurso "Experiência Nota 10", promovido pelo site da empresa NET, e cujo prêmio ao vencedor é um netbook e um datashow para escola. Agora torço para ganhar o prêmio e para que o segundo da tashow que pifou ontem possa ser recuperado com um custo baixo.

À propósito, vence o curso o projeto que tiver mais votos pela Internet, por isso, se quiser votar no meu projeto "a gente agradecemos".

O projeto inscrito é na verdade o curso de Física de Partículas que criei para apoiar as aulas presenciais no ano passado e que supriu a falta de material didático à respeito do assunto e permitiu atividades online usando um ambiente de aprendizagem à distância (EAD baseado em Moodle). O projeto deu certo e os alunos gostaram muito, além de que serviu como primeira aproximação dos alunos com um ambiente de EAD que provavelmente usarão futuramente em cursos e aperfeiçoamentos profissionais.

A votação para o projeto vai até 14/11 apenas. Para votar é preciso fazer o cadastro no site da NET e você pode fazer isso na mesma página onde está projeto (tem um link de cadastro na página do projeto), e também é preciso ter CPF, pois cada um só pode dar um voto.

Para acessar a página do meu projeto e conhecer sua descrição, acesse esse link.

Para ver o curso de que trata o projeto, acesse diretamente esse link e entre como "visitante" na página de login.

Nós, professores e alunos aqui da EE Neuza Nazatto, que tivemos nosso datashow "apagado", mas que  gostamos de tê-lo "acesso" regularmente, agradecemos seu voto.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

E la nave va


Às 5:30 da madrugada do domingo eu publiquei aqui no blog a notícia de que havia retornado às minhas aulas após um período de dois meses de afastamento. Ilustrei o artigo com a imagem de uma lápide onde se lê "Aqui jaz as férias, JC está de volta" (veja o artigo, vá!). Algumas horas mais tarde eu recebi a notícia de que um dos meus colegas, professor da minha escola, havia falecido: o professor Denilson (foto ao lado).

Como um soco no estômago, doeu, e como se fosse uma piada de mau gosto, demorei para entender. Mas depois a ficha caiu. Ele morreu mesmo. Enquanto eu anunciava a morte das minhas férias o tempo corria contra a vida de Denilson e, algumas horas depois, era a morte dele que estava sendo anunciada.

Aos quarenta e sete anos Denilson parecia um adolescente de 15 quando falava da vida. Ele queria muito viver. Sua gargalhada ecoava pela escola e pelos corredores. Ele até poderia não ser, mas certamente parecia feliz.

Na escola os alunos sabiam que tinham que respeitar os horários da aula do Denilson. Atrasados não entravam. Prazos tinham que ser cumpridos. E ele os fazia cumprir. Às vezes durão, às vezes nem tanto, ele era mesmo um coração mole que gostava muito de seus alunos embora não deixasse muito que isso transparecesse.

Denilson morreu em um domingo, véspera de feriado de finados, e não deixou para nós nenhum dia letivo suspenso, exceto o período da manhã da terça-feira, quando a escola lhe fez uma homenagem e suspendeu as aulas. Morreu longe, me parece que em Brotas, em um churrasco, e ninguém daqui foi ao seu enterro (que eu saiba). Os alunos vão falar da morte dele durante a semana toda, mas outro vai entrar com um punhado de giz e a História continuará, com outro professor de História. A vida continuará para todos nós, até o dia em que acabar e formos esquecidos também.

Dei carona ao Denilson muitas vezes, tive muitas conversas com ele, as vezes longas. Posso dizer que dentre os professores ele foi um dos que sempre esteve disponível para um bom papo, e falava sobre qualquer assunto, embora tivesse sempre uma grande preocupação com os assuntos relativos à Educação. Era sim um grande sujeito, apesar de todas as críticas que lhe fizeram em vida e as que farão agora, que está morto.

Acho que Denilson soube viver bem seus poucos quarenta e sete anos. Não deixa filhos, nem livros e, ao que se sabe, não plantou árvores. Mas deixa-nos outra vez uma oportunidade de reflexão sobre o quanto insignificantes somos diante da pretensão que temos de querermos ter alguma importância além da própria existência.

Fiquei triste. Mas me lembrarei das gargalhadas que demos juntos, das contas que não pagamos e de como lembrávamos mais dele em vida do que nos lembraremos agora, na morte.

Tchau Denilson. Foi um prazer ter conhecido e convivido com você o pouco que convivemos.

domingo, 1 de novembro de 2009

De volta para o passado





Não, não estou falando do título de nenhum filme não, estou falando da minha volta à sala de aula depois de um certo e incerto merecido descanso.

O retorno à escola é sempre algo emocionante: ninguém sentiu saudades, ninguém ligou, ninguém mandou flores. É óbvio, eu não morri.

Se tivesse morrido, e numa quarta-feira de manhãzinha, de preferência na própria escola, então as aulas seriam suspensas devido ao "constrangimento emocional causado aos alunos", na quinta as aulas seriam suspensas porque os professores colegas faltariam para ir ao enterro (embora fossem ao boteco e não ao cemitério) e na sexta... bem, sexta-feira nunca foi dia de aula mesmo, então emendariam. Daí sim, eu ganharia uma ridícula coroa de flores baratinha e comprada com as migalhas doadas à contragosto pelo corpo docente e amigo. Mas, para o azar de todos, estou vivo!

Descobri que nos dois meses que estive fora, a programação do meu curso "andou para trás". Yes! Parece que voltamos alguns capítulos. Seria estranho se não fosse uma verdadeira escola pública, mas aqui é normal.

Não, não adianta culpar os meus substitutos, eles fizeram o melhor que puderam. Além disso, quem se importa? Estão todos igualmente felizes e satisfeitos. Ninguém acompanha essa tal de "programação" mesmo. Currículo é só uma carta de más intenções e a aprendizagem... bom, deixa prá lá, ninguém se importa também.

Ainda estou em fase de "atualização de dados". Já sei, por exemplo, que as reposições de aula aos sábados são mesmo uma farsa como todos sabiam de antemão (mas não contem para ninguém, porque o que conta é contar os dias letivos... ops, contei!). Todos sabiam que os alunos não iriam, que os poucos que fossem seriam apenas "enrolados" (no bom sentido, é claro) e que, ao fim e ao cabo, a culpa é de quem mandou dispensar os alunos para as festas gripais de meio de ano para depois convocá-los para aulas fantasmas de final de semana. Tudo bem também, ninguém liga mesmo.

Também descobri que apenas cerca de 1% apenas dos meus alunos ainda vão para a escola levando o livro didático. Mas afinal, para "andar para trás" para que se precisa de livros? Agora vou gastar o resto do ano cobrando deles que "descubram onde enfiaram os seus livros".

Vou aproveitar a catastrofe curricular e relançar meus cursos online (EAD na plataforma Moodle) de apoio às aulas presenciais. Pelo menos assim, se os alunos não aprenderem física, eles aprenderão a aprender em um ambiente virtual de aprendizagem.

Ainda tenho cerca de um mês de aulas, ou quatro semanas, para dar conta dos conteúdos do quarto bimestre (e o que mais for preciso) e para terminar tudo e avaliar os alunos. Depois disso vem dezembro e, como sabemos, dezembro também não tem aulas, tem somente dias letivos. Puxa, como temos dias letivos! São duzentos!!! Se tivéssemos aulas em alguns deles faríamos uma revolução educacional.

Como sou um professor otimista, que acredita em duendes e discursos políticos, vamos que vamos!