terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Uma corrigenda extemporânea

Acabei de receber um puxão de orelhas de uma amiga que percebeu que justamento o título da mensagem anterior continha um gravíssimo erro de português: a palavra "agradece" aparecia grafada como "agradeçe". É vero, estava errado mesmo e já consertei o título e "agradeçi" a moça. Valeu, Tanatus Girl!

Daí que acaba de me ocorrer um pensamento recorrente: será mesmo verdade que a escola nos emburrece? Não, não estou me perguntando se ela emburrece os alunos (isso nós já sabemos!), estou me perguntando se ela não emburrece também a nós, professores.

Me lembro que quando eu saí da universidade (acho que eu e Cabral nos formamos quase na mesma época) resolver a equação de Dirac era uma barbada quase tão fácil quanto usar a notação de Feynman para determinar amplitudes de probabilidades de transição em núcleos atômicos. Moleza que qualquer físico adolescente fazia mesmo estando bêbado em dia de prova. E agora? O que sobrou de mim quando começo a escrever "agradece" com "ç"?

Bom, há que me darem algum desconto, afinal até a Secretaria de Educação aqui de São Paulo já publicou "encino", assim mesmo, com "c", no material distribuído aos professores de inglês da oitava série no ano passado. É claro que foi apenas um engano e todos sabemos que "herrar é umano", portanto, "a gente agradeçemos a paçienssia" e, além disso, como dizem insistentemente nossos alunos prós-graduados em progressão continuada: "ah tio, não dá nada não, e se der é pôca coisa".

Mas, voltando à questão: qual será o efeito causado sobre um "bom professor" pelos anos e anos ensinando para turmas pouco motivadas, recebendo salários miseráveis, não tendo reconhecimento nem mesmo pelos seus superiores mais imediatos, navegando entre "pedagogias da moda de cada governo", não dispondo de recursos, sendo malhado pela mídia e utilizando menos que 10% do seu conhecimento específico da área (o que já é um exagero para os padrões de qualidade atuais)?

Há professores e professores. Alguns têm múltiplos interesses, gostam de aprender sempre, se interessam de fato pela carreira e procuram sempre se manterem atualizados, inovam, têm prazer em melhorar. Outros, como em qualquer carreira, veem no magistério apenas uma profissão como outra qualquer, assinam o livro ponto e colocam sempre os mesmos tijolos, uns sobre os outros, na mesma parede sem fim que vêm construíndo há anos. Ao fim e ao cabo os dois professores receberão os mesmos salários, os mesmos elogios (nenhum) o mesmo reconhecimento da mídia e da sociedade... Mas depois de tantos anos nessa batida de samba de porão de navio negreiro, o que restará do segundo professor? O que restará daquele que, vivendo em um meio medíocre, onde a nulidade recompensada pelo silêncio vale mais que as contendas que trazem desafetos, o que restará dele?

Ok, acho que já paguei pela cedilha.


3 comentários:

  1. clap clap clap! beleza de mea culpa, teacher. Valeu.

    beijão,

    merrel

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  2. JC,
    Ótima reflexão... Isso dá um fôlego danado para mim que estou ainda na primeira etapa do magistério público. O prazer de aprender não tem quem pague... eu ando aprendendo...
    Abraços

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  3. Prof. Zé.

    Competência, dedicação, reflexões lógicas etc. admiráveis.
    Se, na altura da vida, não aprendo Física, vou tentando apreender e aprender essas' qualidades' com você. Ainda é tempo. Bela nave, grande amigo. Parabéns.
    Beijão!
    tania tanatus

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