domingo, 29 de março de 2009

A "Grande Chefa" pediu a conta

Na última sexta-feira, 27/03, após cerca de um ano e meio no cargo, e num dia em que os professores passaram o dia todo reclamando de seus "bônus por mérito" (divulgado nesse dia), a Secretária da Educação de São Paulo, minha "Chefa-Mor", Maria Helena Guimarães, pediu a conta (ou o governador pediu a conta dela, tanto faz).

Até 15/03 ela continua no cargo, enquanto o seu substituto, ex-ministro da Educação de FHC, Paulo Renato, faz seus preparativos para assumir. Parece estranho esse negócio de anunciar demissão com 15 dias de aviso prévio, mas o que não parece estranho nessa história toda?

Maria Helena "liquidou" com a política "paz, amor e vagabundagem", do ex-secretário Chalita, e implantou uma política voltada a resultados, cumprimento de metas e de um currículo mínimo que nunca será cumprido. Teve lá seu lado bom, e teve também seu lado ruim. É cedo para pesar na balança e tirar conclusões definitivas.

A crescente resistência à sua política educacional e os seguidos "furos" e "trapalhadas" resultantes da implantação dessa política, parece que acabaram minando sua secretaria e lhe tirando o emprego. No fundo ela deve estar aliviada: a educação paulista é mesmo de tirar o sono de qualquer um.

Para Maria Helena talvez isso signifique sua aposentadoria, para Paulo Renato provavelmente significa garantir novamente o Ministério da Educação se, José Serra, atual governador, vier a ganhar as eleições de 2010. Para mim, como professor que vem vivendo sob a política educacional tucana há quase uma década e meia, acredito que não mude nada.

quinta-feira, 26 de março de 2009

E não é que a festa acabou?

Esse ano, com a chegada dos livros didáticos (que, aliás, estão em falta para os alunos dos terceiros colegiais da noite), chegou também um novo problema: convencer os meus queridos aluninhos de que o livro não é apenas um elemente de decoração da estante do quarto deles. Sim, tem mesmo aluno que acredita que o livro didático foi feito para não servir para nada.

Tem também o aluno que acredita que só deve trazer o livro didático para a escola quando o professor pede, mais ou menos como se o livro tivesse lá sua utilidade uma vez ou outra, quem sabe. E aí, quando o professor pede, ele esqueçe. :)

Esses alunos são umas figuras!

Minha política de uso do livro didático é extremamente liberal: traga o livro todos os dias!

O livro serve para consulta, estudo, resolução de exercícios, apoio às explicações do professor e, além disso, justifica um pouco (mas só um pouquinho) a enormidade de impostos que pagamos ao governo federal. O mesmo vale para os caderninhos do aluno que a SE enviou esse ano.

Tem aluno que se rebela:
  1. "E se eu trouxer o livro e o professor não usar?". Essa é boa! O livro é para o aluno usar, não para o professor. Professor que se preza não usa um livro, usa uma biblioteca inteira!
  2. "É muito pesado para trazer para a escola!". Ah, me poupe vai. Um pouco de ginástica faz bem e evita a obesidade na adolescência.
  3. "E se eu esquecer?". Não tem problema: a) leva um bilhetinho para a mamãe para ela ajudá-lo a se lembrar de trazer na semana que vem; b) eventualmente terá que fazer um certo exercício de cópia para ter no caderno aquilo que está escrito no livro e que não precisaria ser escrito de novo no cardeno... Sacou?
  4. "E se eu esquecer de dar o bilhetinho para minha mãe assinar e esquecer o livro de novo?". Aí a gente entra em contato direto com ela, solicitando sua presença na escola, e pede para ele comprar um remédio para a memória do filhinho.
  5. "E se eu...". Ei! Stop man! Vamos parar com essa frescura e trazer o livro de uma vez?!
Resultados parciais:
  • Primeira semana: vários bilhetinhos;
  • Segunda semana: poucos bilhetinhos e alguns alunos advertidos;
  • Terceira semana: não chegou ainda, mas se a tendência da "curva de esquecimento" se mantiver, teremos apenas um ou outro aluno que precisará do remédio para memória.
E assim caminha a humanidade...

terça-feira, 24 de março de 2009

Bons meninos e meninas

Eles ouvem quando eu falo, falam quando quero ouvi-los, estudam para valer e se divertem "pra caramba"! São eles, meus meninos e meninas do 3AS (EJA).

Domingão tivemos um churrasco na chácara da tia (?) da Nanci. Churrasco do 3AS, meus aluninhos do EJA (Ensino de Jovens e Adultos). Haja animação!

Mas a animção não é só para churrascos não, eles também tem "pique" para assistir minhas aulas em plena noite de sexta-feira. De onde tiram tanta energia e motivação?

Uma possível explicação talvez seja a de que finalmente puderam voltar à escola, depois de muitos anos excluídos dela e, desta vez, foram acolhidos e não massacrados como outrora.

Todos os meus pequeninos do EJA já tentaram antes, mas desistiram pelas mais variadas razões. Trabalho, problemas familiares, insucessos seguidos, etc. Eles são do tempo em que a escola não tolerava alunos que não fossem capazes de se adequar a ela de forma quase perfeita, e muitos pensavam, nessa época, que a escola nunca lhes seria de alguma utilidade. Agora são crescidinhos, já descobriram como é a vida sem escola e estão redescobrindo como é a vida "na escola". Em uma "nova escola", uma escola que "também é para eles".

Me impressiona ver como discutem temas de física com a mesma, e às vezes ainda maior, empolgação que os adolescentes. Me dá ânimo saber que ,apesar do cansaço da semana toda, eles estarão lá, na sexta-feira.

quarta-feira, 18 de março de 2009

Mérito e bônus: você tem algum?

"Não há possibilidade de melhorar o desempenho dos estudantes se os professores não se sentirem motivados". (Maria Helena Guimarães de Castro, secretária de Educação de SP)

Concordo com minha chefa. Só não entendo muito bem a relação que ela vê entre "motivação do professor" e "bônus por mérito" (expressão que a Secretaria de Educação usa para se referir ao dinheiro "extra" pago a alguns profissionais em época incerta do ano e por critérios variáveis de ano para ano).

Primeiro porque o "bônus por mérito" é recebido também por todos os demais funcionários da educação e não apenas pelos professores, embora estes sejam os "responsabilizados" pelo fracasso das políticas educacionais.

Segundo porque os critérios para distribuir o "bônus por mérito" têm mudado de ano para ano e aquilo que se poderia chamar de "mérito" não me parece ser exatamente "meritório". Nesse ano, por exemplo, o bônus pago a todos os funcionários da educação depende basicamente do aumento do índice do Idesp (Índice de Desenvolvimento da Educação de São Paulo) da escola, mas não depende do índice em si. Na prática isso significa que se a escola for "excelente" e não conseguir melhor mais, seus professores e funcionários não têm mérito nenhum e, portanto, terão bônus nulo. Já para a escola que é péssima, se melhorar um pouquinho poderá atingir a "meta" em 100% e receberá bônus integral! É o mesmo que dizer que em uma escola que forma analfabetos, mas que melhoraram 5% em relação ao ano anterior, o mérito é infinitamente maior do que o de outra escola que forma excelentes alunos mas que não teve 5% de melhora na sua excelência.

O Idesp leva em consideração apenas as avaliações do Saresp de português e matemática e o indicador de fluxo (grosso modo: quantos alunos passam de ano em relação ao total de matriculados) e só leva em consideração os alunos das séries terminais (quarta e oitava série do Ensino Fundamental e terceiro colegial no Ensino Médio). Com base no aumento desse índice a secretaria infere até que ponto todos os funcionários da escola têm ou não mérito.

Aqui na EE Neuza Nazatto nós discutimos hoje os números do nosso Idesp. No Ensino Médio nossa meta foi superada em 120%, mas no Ensino fundamental nosso Idesp caiu em relação ao ano passado. No cômputo geral atingimos 85% da meta. Seja lá o que for que isso signifique em termos de "mérito", na prática significa que todos os funcionários deverão receber algo como dois salários extras. Meus credores agradecem a generosidade com o dinheiro público, mas eu particularmente não vejo nisso nenhum incentivo a mais ou a menos para o meu trabalho. Talvez eu ficasse realmente mais motivado e me sentisse de fato "reconhecido por mérito" se a cada mês eu recebesse um salário cinco vezes maior do que o que eu recebo... Mas aí só sendo político ou amigo de governante, né?

Paraguai e Uruguai mudam de endereço e Chile desaparece do mapa!

Não, não houve nenhum cataclismo, terremotos, maremotos ou queda de gigantescos meteoritos, é apenas a "nova geografia" do Caderno do Aluno e do Caderno do Professor da sexta série fornecidos pela Secretaria de Educação de SP. O Itamarati já está em contato com esses países para tranquilizá-los. :)

Tudo bem, eu não tenho nada a ver com isso, já que as Leis de Newton ainda não foram modificadas e eu continuo professor de Física, mas como esse é um mico impagável, eu não poderia deixar passar batido. :)

Agora vamos ao que interessa: será que não tem um jeitinho de desaparecer com metade do segundo colegial A? Nada contra aqueles meninos e meninas simpaticíssimos, mas é que mais de quarenta adolescentes espremidos em uma salinha de aula é muito pior, na minha opinião, do que um simples erro de diagramação de quem fugiu da escola ou, talvez pior, tenha frequentado uma escola superlotada. :)

Alguns gênios da pedagogia já vêm alertando há tempos que é preciso ter um acompanhamento individual de cada aluno, que não se pode tratá-los como se fossem gado indo para o abate, em grandes manadas. Há milhares de textos assinados por gente de peso (opa, não estou chamando ninguém de gordo, ok?) que cobram insistentemente de nós professores uma atenção diferenciada para cada aluno. Avaliações devem levar em conta as individualidades, recuperações e estudos aprofundados devem ser customizados, habilidades específicas devem ser apontadas, exploradas e enfatizadas para cada aluno, mas...

Mas a matemática é inimiga das trapalhadas e não permite que a sujeira fique impune embaixo do tapete. Então vejamos, se você está contente com o atendimento que recebe na emergência do SUS, onde um paciente passa em média seis minutos e meio com o médico, se acha que isso está bom para você e que em seis minutos e meio o médico pode fazer um bom diagnóstico, então preocupe-se! Sim, aqui na escola, no segundo colegial A, as coisas são bem piores...

Em uma aula de 50 minutos, subtraídos o tempo de chamada nominal dos alunos e os tempos de acomodação no início e no final da aula, restam, no máximo, 40 minutos. Se distribuíssemos esse tempo igualmente entre os alunos isso resultaria em MENOS DE UM MINUTO para cada aluno! Sim, é isso mesmo! Em menos de um minuto o professor deve fazer o diagnóstico do aluno e prescrever o melhor remédio pedagógico!

Claro, isso supõe que o professor não "explicará nada para a classe", que ele não corrigirá tarefas, não comentará provas e nem abrirá nenhum livro. Estamos falando apenas no tempo despendido para cada aluno para fazer essa pequena diagnose diária onde o professor detecta todos os problemas de aprendizagem do aluno, verifica o que ele aprendeu ou não, levanta seus problemas particulares, detecta novas habilidades, verifica o desenvolvimento das habilidades que estão sendo trabalhadas, tira as dúvidas particulares desse aluno, estimula-o e registra tudo isso em seu diário. Tudo isso em UM MINUTO!!!

Legal né? Por isso que eu parei de contar piadas de português. Como já diz certo humorista famoso, o Brasil é o país da piada pronta. :)

(*) Ah sim, a fotografia acima é apenas ilustrativa e não mostra nenhum dos meus alunos... Mas as grades até que se parecem com as dos portões daqui...

quarta-feira, 11 de março de 2009

Meninos-bomba

Homens-bomba não são uma invenção da modernidade, são apenas uma variação tecnológica dos mártires de outrora. Eles morrem e matam por uma causa, a meu ver estúpida, mas justificada por uma forte crença na auto-imolação e um profundo desprezo pelo sofrimento alheio. Nas terras brazucas não brotam homens-bomba, ainda bem! Mas brotam meninos-bombas...

Toda escola pública que se preza já viu ou verá um desses meninos-bomba. Em geral são alunos que se confundem na multidão e quando se destacam raramente o fazem por algum mérito. Eles não têm ideologias nem propósitos, não querem ferir ninguém e ao invés de serem reconhecidos pela violência, pelo terror ou por sua capacidade destrutiva, tudo o que querem e precisam é de alguém que lhes coloque no colo, lhes cante uma canção de ninar e os convença de estarão protegidos, que serão amados e admirados com todos os seus defeitos.

Embora em essência eles sejam muito diferentes dos homens-bomba, nas ações eles se parecem bastante. Ambos são destrutivos, ambos atraem o ódio e o desprezo ao invés da admiração e reconhecimento que almejam.

Ontem à noite tivemos uma pequena explosão no banheiro dos meninos. Foi um desses meninos-bomba. Por um feliz acaso do destino ninguém se machucou e nem houve danos consideráveis, apenas um ruído forte, uma espécie de grito de apelo do garotinho que fez a traquinagem, como que berrando ao mundo: Olhe para mim, eu existo! Eu quero ser amado! Eu não sinto que tenha nada bom para oferecer em troca, mas mesmo assim, por favor, me ame!

A verdade é que ele não será amado por ter colocado em risco a integridade física dos seus colegas. Não será admirado por ter feito um ato covarde e irresponsável, e nem vamos nos orgulhar de seu feito como se fosse algo corajoso que merecesse alguma admiração. Ele será cassado, perseguido, humilhado e, se encontrado, será severamente punido. É assim que terminam os meninos-bomba.

terça-feira, 10 de março de 2009

Se os alunos fazem, porque os professores não fazem?

Nas semanas anteriores apresentei para meus alunos a minha famosa "Caixinha de Glub-Glub", uma caixinha com um mecanismo de funcionamento desconhecido pelos alunos que serve de apoio para a discussão sobre os modelos explicativos da ciência em geral e da Física em particular, além de propiciar uma rica discussão sobre o "método científico" de uma forma geral nos primeiros colegiais, o modelo atômico da matéria nos segundos colegiais e o experimento de espalhamento de Rutherford no terceiro colegial.

Minha Caixinha de Glub-Glub é secreta, é claro, e ela tem essa função mesmo: ser secreta! Muitos alunos proõem explicações para seu mecanismo bem próximas da realidade (será mesmo?), mas alguns deles extrapolam e criam suas próprias caixinhas secretas. Foi isso que ocorreu na turma do terceiro colegial do EJA, onde um aluno que gosta de fazer miniaturas e de construir coisas criou sua própria "Caixinha do Curioso" com um mecanismo que ele desenvolveu sozinho, sem ter a menor idéia do mecanismo de funcionamento da minha caixinha. Veja abaixo o filme que ele memso fez mostrando o mecanismos de funcionamento da sua "Caixinha do Curioso":


A grande questão aqui é: se até nossos alunos fazem esses brinquedinhos que são bastante úteis como ferramentas pedagógicas, porque nós professores achamos que não temos tempo para fazê-los? Será falta de tempo mesmo ou haverá também ai uma certa "má vontade"? Seja lá como for, além da sugestão de mecanismo que dei em uma mensagem anterior (com link para o artigo que descreve a caixa-preta, veja no meu blog "Física com Sabor"), temos agora mais essa sugestão, dada por um aluno do EJA e que, convenhamos, é uma excelente sugestão.

Obrigado, Toninho! Alunos como você é que pagam de fato o meu salário.

segunda-feira, 9 de março de 2009

Revistas para o professor

Há cerca de um mês eu me queixei com a editora da revista "Pesquisa Fapesp" sobre a falta de descontos promocionais para professores do Ensino Médio. Por ser uma revista de divulgação científica de ótima qualidade e, além de tudo, escrita em português, eu esperava que a revista investisse no público formado por professores do Ensino Médio e, em especial, nos professores da rede pública.

Em uma troca de e-mails com a editora da revista, fiquei sabendo que há tempos eles tentam amarrar uma parceria com a Secretaria de Educação de São Paulo, mas ao que parece ainda sem sucesso. De qualquer forma consegui um desconto de 50% na assinatura da revista e recomendo que os colegas interessados entrem em contato com a editoria da revista a fim de obter o mesmo desconto.

Enquanto isso... Recebo agora a notícia do jornalista Mario Augusto Jacobskind, no blog "Direto da Redação" ("Serra e Abril: tudo a ver"), de que o Governo do Estado de São Paulo estabeleceu um contrato sem licitação com a Fundação Victor Civita no valor de R$ 3.740.000,00 para a aquisição de 220.000 assinaturas da revista Nova Escola. Tirando o fato de que o contrato foi estabelecido sem consulta prévia aos professores e que não houve licitação, segundo informa o jornalista, no mais eu acho essas assinaturas uma ótima idéia. Pena que, como ninguém me perguntou se eu queria essa assinatura ou se eu já a possuia, agora ou receberei duas revistas "Nova Escola", ou continuarei a receber apenas a que já assino e já paguei.

Mudando um pouco de assunto, mas sem sair do tema "materiais impressos", recebi, enfim, o meu "Caderno do Professor" de Física para esse ano. Se tivessem me avisado que ele seria igual ao do ano passado eu não teria nem ficado preocupado com o fato de ele só ter sido distribuído agora (05/03). Agora falta resolver o problema do livro didático dos meus alunos do terceiro colegial noturno.

Segundo o que me informaram na própria escola, a quantidade de livros didáticos enviados pelo MEC no programa PNELEM baseia-se nos dados coletados no ano anterior. Como nesse ano de 2009 temos mais alunos no terceiro colegial (Uáu! Isso é ótimo, não?) do que tínhamos no ano passado, acabamos recebendo menos livros didáticos do que o necessário.

Uma primeira solução consistiu em "esperar" até que os livros fossem distribuídos nas demais escolas da Diretoria de Ensino e então verificar na própria Diretoria se haveria alguma "sobra" de livros em algumas dessas escolas, de onde obteríamos então os livros que faltam. Enquanto isso os alunos dos terceiros colegiais do período noturno ficam sem livros (já que não dá para distribuir para todos).

Veio agora a notícia de que "não temos sobras desse livro", ou porque os livros que sobraram em outras escolas da DE são diferentes, ou porque faltam livros mesmo. O fato concreto é que não há sobra e, pasmem, também não há na Diretoria de Ensino nenhuma aparente solução para o problema! Em outras palavras: danem-se os alunos, ninguém mandou estudar em escola pública. Ou fazemos uma loteria do livro diático e distribuímos os livros que temos para os felizardos ou, democraticamente, como a escola adora ser quando se trata de espalhar a mediocridade, deixamos todos sem livros para respeitar a igualdade de direitos!!!

Será mesmo que não se consegue os trinta livros de física que faltam? Eu posso estar enganado, mas não creio que esse seja um problema "sem solução", da forma como tentaram me vender o peixe. Pensando nisso acabei de enviar uma consulta diretamente ao MEC pedindo orientações. Vamos ver se por lá o papo também já está encerrado ou se é possível conseguir esses trinta livros "com um pouquinho de boa vontade" de algum educocrata. Por via das dúvidas já começo a preparar os bilhetes de loteria para distribuir os livros que temos. :)

A propósito, se sua escola tem sobras do volume três da coleção "Física - Ciência e Tecnologia" (Editora Moderna), por favor, entre em contato comigo.

quinta-feira, 5 de março de 2009

Logística escolar

Segundo a Wikipédia, "Logística é a área da gestão responsável por prover recursos, equipamentos e informações para a execução de todas as atividades de uma empresa".

As aulas iniciaram em 16/02, após um ligeiro atraso imprevisto decorrente de outros imprevistos e atrasos, mas somente hoje, 04/03, desesseis dias após o início das aulas, tive a feliz oportunidade de conhecer enfim os meus alunos de duas primeiras séries. Agora já (quase) posso dizer que consegui entrar em todas as minhas salas de aula.

O meu planejamento escolar para a disciplina de Física já está pronto e publicado na Biblioteca Digital do meu site, mas os Cadernos do Professor, que eu procurarei usar como parte das atividades de ensino regular em minhas aulas, ainda não chegaram na minha escola. E ainda teremos mais uma ou duas semanas até que os cadernos dos alunos sejam distribuidos para eles (e depois mais alguns dias até que os cadernos que faltarão possam ser providenciados e distribuídos... E mais alguns dias até que os livros didáticos que faltam sejam também providenciados, ou não, e distribuídos, ou não - como diria Caetano).

O horário de aulas, que muda todo dia, estava finalmente pronto ontem (segunda-feira), mas hoje não apenas ele terá que ser mudado como também terá que ser mudada a carga horária de alguns professores, pois sob orientação dos "superiores" minha escola "extinguiu" uma classe de segundo colegial do período da manhã e abriu outra no período da noite. Logo, teremos mais uma semana de tentativas de acerto do horário de aulas em função dessas mudanças; teremos alunos mudando de sala e um novo recomeço nas novas salas "misturadas". Claro, teremos professores que perderão aulas e aulas que não terão professores, mas como tudo é feito para o bem dos alunos...

Dizem que o segredo para o sucesso de uma empresa, seja lá qual for a empresa, é possuir uma boa logística global. Um bom planejamento e uma execução rigorosa desse planejamento dentro de um cronograma também muito bem planejado permitem que as engrenagens funcionem em sincronia, sejam elas mecânicas ou sociais.

Só a escola teima em querer ser uma espécie de "ET" para o qual não se deve aplicar nenhuma das ciências, sejam exatas ou humanas. É como se a escola fosse uma espécie de criatura sobrenatural para a qual não pode haver uma lógica, uma razão e uma tecnologia que façam sentido. A escola parece ter a pretensão de querer transcender a humana materialidade da existência e se colocar no patamar das deidades cujos caprichos ditam novas leis a cada novo desejo.

É nessa escola, onde a logística é um capricho de deuses loucos, que temos que tornar realidade os mandamentos sacrossantos de uma bíblia reescrita a cada dia. Saravá, mozifio!

quarta-feira, 4 de março de 2009

A vida como ela é

Se eu tivesse contado todas as histórias que tenho para contar nesses 26 anos como professor eu precisaria de uma biblioteca muito grande para acomodar tantos "causos". As que nunca contei acho que nunca contarei porque a cada dia são tantas as novas histórias que eu precisaria de muitas vidas simultâneas para dar conta de recordar o passado. Então vamos ao presente... E que presente!!!

Ontem (agora à pouco, já que mal começou a madrugada da quarta-feira), subi as escadas para a primeira aula em uma de minhas classes do noturno. Estranhei o aluno novo que encontrei no corredor ainda antes de subir as escadas: um cachorrinho poodle todo faceiro e animado no meio da multidão de alunos que sempre entram em cima da hora.

Subimos juntos, eu, a multidão de alunos e o cãozinho poodle. Aluno novo? Perguntava um aluno. É o irmão de fulano, dizia outro; que nada, é cara de sicrano, emendava um terceiro. E assim, entre piadas e congestionamentos nos corredores e escadas, subimos todos.

Quando consegui chegar à porta da minha sala, quem vejo lá dentro? Exato, o próprio cãozinho. Ele entrou, foi até a primeira carteira da segunda fileira ao lado da parede com janelas (e grades nas janelas - sim, escola pública está mais para cadeia do que para escola - dizem que é item de segurança, mas para mim é apenas mau gosto), sentou-se em baixo da carteira e ficou lá, quietinho.

Entra um atrasado e... "Olha, aluno novo!"; entra mais um e... "Crédo, o que é isso?". E assim foi pelos dez minutos iniciais da primeira aula, onde de aula mesmo não há nada, apenas um desfile de gente entrando e se acomodando.

Eu já estava ensaiando um "boa noite" quando chegou mais uma atrasada e foi procurar seu lugar. De repente parece que o mundo parou, o tempo parou, o ruído parou, tudo parou e só havia dois personagens para encenar o resto da história: a menina e seu cãozinho poodle perdido.

Sim, o cãozinho era da menina atrasada. Ou talvez a menina atrasada fosse do cãozinho. Acho que não importava muito agora. Os olhinhos de ambos avermelharam, brilharam e gotejaram felicidade.

O cãozinho havia seguido a menina até a escola na segunda-feira, mas o vice-diretor, encarregado de colocar alguma ordem na bagunça noturna, não deixou o pobrezinho entrar porque, segundo alegações do próprio, ele estava sem uniforme. A menina entrou e o cãozinho ficou de fora.

Mas o cãozinho sumiu, não voltou mais para casa, perdeu-se por ai. Procuraram-no, em vão. Já dado por perdido, na terça à noite eis que ele reaparece na escola, entra no meio do turbilhão de alunos aplicando um legítimo "171" no vice-diretor (que dessa vez não o pegou, assim como as vezes não pega outros alunos que esquecem dos uniformes), segue a multidão por corredores onde nunca esteve, sobe as escadas que nunca subiu, escolhe uma entre as nove salas que nunca visitou, entra e se senta tranquilo à espera da sua dona, que de fato chegou, entrou e o encontrou.

Final feliz, é claro. Abraços, beijos, lambidas e rabinhos abanantes. O mundo voltara a existir então e a sala parecia não compreender muito bem o que tinha presenciado. A menina pediu permissão para ir até a diretoria com seu cãozinho solicitar permissão para levá-lo para casa. Concedi, é claro. E lá na diretoria lhe foi concedida a outra permissão. Mais tarde ela retornou, lá pelo meio da segunda aula.

Alguns dizem que só mesmo um milagre para a Educação Pública se tornar boa no Brasil. Bobagem. Milagres acontecem todos os dias nas muitas salas de aula pelo país afora. O que talvez precisemos é cultivar melhor esse gosto pelas coisas gostosas que perdemos em meio à tantas outras coisas sem nenhuma graça. Dos noventa minutos de aula de que dispúnhamos acho que efetivamente tivemos uns sessenta, talvez nem isso. Mas por incrível que pareça, com tantos doces imprevistos, esses sessenta minutos duraram tanto quanto os minutos de reencontro entre o cãozinho e sua dona e hoje tivemos uma aula fenomenal e extremamente produtiva, participativa, rica em conteúdos e discussões... Milagres, estão por toda parte...