sábado, 19 de dezembro de 2009

Boas Festas!!!

Queridos e queridas, o ano acabou!
Após um ano relatando as trapalhadas, aventuras e desventuras de uma escola pública, eis que acaba a festa. A partir no ano que vem esse blog não existirá mais e, portanto, desculpo-me com os seus seguidores. No ano que vem outros blogs meus deverão continuar e talvez alguns novos aparecem, mas este aqui já cumpriu sua função e, com o ano velho, será página retirada da folhinha.

Nessas últimas semanas as "profecias" dos posts anteriores se cumpriram letra a letra. Os alunos mais "queridinhos" foram aprovados, os mais "pentelhos" foram reprovados (pura vingança) e no ano que vem os mesmos discursos hipócritas sobre a educação, projetos, etc. etc., ocuparão a pauta das reuniões de início de ano. Ao longo do ano teremos as mesmas histórias (razão pela qual não pretendo contá-las duas vezes), os mesmos fracassos e algumas novas pequenas vitórias. No final, tudo terminará como sempre termina: em pizza pedagógica embalada pelo côro do "não dá nada não".

Estou reduzindo minha carga horária para dez aulas semanais e espero que com isso contribua para a melhoria da qualidade do ensino paulista, dando espaço para os professores novos que estão ávidos por seguir essa carreira no magistério paulista, onde salários gigantescos são pagos aos professores e onde não faltam recursos e nem investimento.

Foi muito bom e divertido contar nesse blog um pouco do cotidiano de uma escola pública, mas infelizmente nem tudo pode ser dito e nem tudo deve ser dito. Essa é outra das razões pelas quais esse blog deve morrer.

Desejo à todos um Feliz Natal e um Ano Novo com muita saúde e felicidades.

Abraço,
JC

sábado, 5 de dezembro de 2009

Dezembro, preguiça e empurra-empurra

Tivemos uma semana curta, nesse início de dezembro, com direito a feriado local (aniversário da cidade) em plena sexta-feira. Os alunos, conforme todos sabem, já bateram em retirada. Aparecem alguns para entregar tarefas atrasadas ou tentar negociar alguma saída para o problema sem solução que criaram ao longo de um ano todo: falta de "nota".

É interessante perceber que o que se quer é sempre "nota", "aprovação" e "custo zero". Economicamente falando, esse é o princípio fundamental do capitalismo moderno: o maior lucro possível com o menor investimento e sob risco zero. A escola é moderna nesse sentido. Vejamos porque:

1 - As classes que temos são multisseriadas, como aquelas de escolas rurais em que os alunos de todas as séries estudam juntos sob os cuidados de uma única professora. A diferença aqui é que eles estão todos em uma mesma série e classe, embora uns poucos estejam na série correta e a maioria esteja com defasagem de um, dois, três ou até quatro anos (ou mais!) de defasagem em relação à aprendizagem. É óbvio que em um ambiente multisseriado onde os alunos são obrigados a terem um currículo igual para todos, as mesmas avaliações, as mesmas atividades e um tempo irrisório de contato individual com o professor, o resultado é que a nivelação é sempre feita por baixo. Se não se fizer isso teremos a aprovação apenas dos alunos que realmente deveriam estar nessa série, ou seja, algo em torno de 10 a 20% da sala;

2 - Os oito anos de progressão continuada que os alunos já vivenciaram no Ensino Fundamental já os educou para serem irresponsáveis, inconsequentes, desmotivados, desonestos e imaturos. Sem falar da óbvia falta de aprendizagem. Então não se pode esperar que no Ensino Medio iremos conseguir transformar em um, dois ou três anos, esse mesmo aluno em um aluno "idealizado pelos exames externos" (razão pela qual os resultados desses exames são tão ruins). Mas não foram só os alunos que foram educados para acreditarem que a escola não têm nenhuma importância em suas vidas... a escola também foi! A própria escola reconhece que a melhor forma de agir é empurrá-los adiante e deixar que eles resolvam seus problemas futuros a partir de alguma solução mágica que não dependa de suas próprias capacidades;

3 - Os diferentes níveis de gestão do Ensino também apostam suas fichas na teoria do "Grande Tapete", onde se vai empurrando toda a sujeira para debaixo desse tapete e faz-se de conta que está tudo bem. A Secretaria da Educação quer resultados para barganhar politicamente e instrui os órgãos vinculados a ela a criarem meios de produzir esses números isentando a própria Secretaria de qualquer responsabilidade. As DEs, que se parecem bastante com braços políticos-corporativistas, orientam supervisores e diretores a seguirem a cartilha recebida sem qualquer contestação ou adaptação e, por fim, estes repassam aos PCOPs e coordenadores das escolas as "ordens que receberam" e, então, esses últimos apenas levam e trazem os "recados" para os professores. O sistema é "perfeito" porque parece agradar à todos;

4 - Os recados que os professores recebem desses pombos-correios do sistema é sempre o mesmo: aprovação a qualquer custo. Nada contra, mesmo porque seria ridículo reprovar um aluno em uma escola tão ruim. Até os pombos, que empesteiam as janelas das salas com seus excrementos, aprendem tanto quanto os alunos "assistindo nossas aulas" ao longo do ano; seria muito injusto reprová-los, os pombos, ou reprovar aos alunos que, pelo menos, usam o banheiro na maioria das vezes;

5 - Por fim, aqueles alunos que vieram à escola uma vez ou outra, e nem sequer cumpriram 75% da frequencia mínima exigida, arrumam atestadinhos, a escola dá as aulas por compensadas automaticamente e arredonda-se a nota, somando-se dois ou três pontos até ficar azul. Pronto! Estão aprovados! Só correm risco de reprovação aqueles que caírem em desgraça com a direção ou com alguns professores que gritam muito em reuniões; estes, coitados, por vezes até reprovam (hoje em dia é mais raro, mas acontece), embora tenham melhor desempenho do que os "queridinhos" dos professores e da direção.

No final das contas olha-se para os números, as "metas", apagam-se algumas notas aqui, mudam-se outras ali e todos ficam felizes porque o objetivo do sistema todo acaba sendo atingido: alunos sempre aprovados, professores recebendo bônus por "mérito", diretores e coordenadores também (e ainda ficam bem na foto junto com supervisores e dirigentes), dirigentes com cargos "de confiança" garantidos, órgãos vinculados que desempenharam seus papéis conforme lhes foi mandado e, por fim, políticos felizes com números "melhores" para apresentarem em suas campanhas políticas.

Enquanto isso, fora dessa escola, milhares de jovens chegam ao "mercado" e ao "mundo" analfabetos-funcionais, irresponsáveis, preguiçosos e à procura do milagre que lhes prometeram e que todos parecem acreditar que vai acontecer um dia para resolver o problema causado por toda essa infinidade de gentes que receberam salários e bônus, mas que não trabalharam como deveriam (como já dizia dona Rose Neubauer, uma que recebeu bastante como Secretária e trabalhou muito pouco - pelo menos se aplicarmos a ela o mesmo critério de "mérito pelos resultados obtidos" que se aplica aos professores).

Agora entramos na semana da burocracia, da papelada, das cadernetas inúteis com anotações falsificadas e destinadas ao lixo (que é o que elas merecem mesmo). Nessa semana dá-se graças à ausência dos alunos, pois assim pode-se cumprir esse ritual macabro de colocar "pinguinhos nos quadradinhos" e copiar subtítulos de livros didáticos na página de "Atividades desenvolvidas com os alunos". Aff! Como isso é irritante!

domingo, 29 de novembro de 2009

Pronto, acabou!

Terminei a sexta-feira, 27/11, às 22:30 e não às 23:00, como deveria ser, porque a direção achou por bem que os alunos já tinham assistido muitas aulas durante a semana. Não contabilizei o quórum das demais salas mas, a minha, como sempre (e exceto quando resolvem faltar coletivamente, como na semana passada) estava cheia. Mas, seja lá como for, acabou. Daqui para frente são só "dias letivos".

Agora a coordenação aguarda ansiosa as médias finais para o início da semana que vem porque a secretaria da escola não têm muito tempo e nem funcionários para digitar as notas na "Prodesp" (Prodesp = órgão místico ao qual aludem os funcionários da secretaria sempre que querem se desculpar de alguma coisa não feita ou quando querem que façamos algo "fora do padrão" para adiantar o serviço deles). Há meses temos uma plaquinha que passa grande parte do tempo pendurada na janelinha fechada da secretaria com os dizeres "Não estamos atendendo por falta de funcionários". Se a idéia pega logo logo teremos uma na porta da sala de aula dizendo "Não estamos ensinando por falta de salários" ou, outra em outra porta dizendo "Não estamos governando por excesso de otários". Enfim, as placas sempre indicam os caminhos e dão boas rimas.

Tenho que fechar minhas notas com cinco semanas de aulas (desde que voltei), das quais perdemos pelo menos uma semana inteira entre feriados, saresps, excursões (de meia dúzia de alunos vão, mas param a escola toda) e "dispensas", como essas das sextas-feiras à noite. O fato é que em algumas salas eu pude dar umas três ou quatro aulas, em outras, cinco ou seis aulas, mas em nenhuma consegui dar as 10 aulas que "teoricamente" aconteceram nesse período e nem em sonho poderei dar as aulas das próximas semanas. Não participei de nenhuma reposição aos sábados e com isso perdi duas missas, uma caminhada e a oportunidade de pintar portões (aula mesmo não existe aos sábados), além de ter "faltas" computadas em meu nome como se eu realmente trabalhasse aos sábados para o Estado.

Infelizmente os meus subsitutos no período em que eu estava afastado não deixaram avaliações para compor com as minhas e isso quer dizer que devo espremer a nota dos meus alunos com base apenas nessas poucas aulas. Aliás, um dos substitutos não deixou nem mesmo as cadernetas das classes onde me substituiu. É isso mesmo, o sujeito levou as cadernetas embora e não as devolveu! E só faz cinco semanas! É no mínimo impressionante.

Na semana que vem teremos apenas alguns alunos perdidos na escola em busca de "notas" e outros que vêm para bater papo. É claro que a escola também promoverá eventos esportivos e culturais que substituirão as aulas tradicionais e que, em um outro contexto, podem até ser boas oportunidades de aprendizagem para os alunos, mas ao fim e ao cabo o que todos parecem querer é apenas que as cortinas baixem e todos possam tirar suas máscaras em paz.

Li nos jornais (e se não fosse nos jornais eu não teria acreditado de tão estapafurdia que é a notícia) que o sindicato da categoria pretende fazer greve em fevereiro... Só se for greve de fome, né? Ainda bem que tudo termina bem e nada "dá nada não".

domingo, 22 de novembro de 2009

A escola que acordou inseto

Semana de Saresp em pleno novembro é palco para todo tipo de festa. Mas a festa aqui já começou bem antes, em plena sexta-feira, 13/11, quando fui convidado a "subir uma aula" para um terceiro ano do noturno porque a classe não tinha professor e eu tinha as duas últimas aulas lá. Subi, e na hora do intervalo a classe foi dispensada pela direção porque seria a única sala a continuar tendo aula após o intervalo (onde já se viu apenas uma classe ser penalizada com aula!).

Na terça-feira "fiquei cumprindo horário à noite" porque os terceiros anos estavam fazendo Saresp. Já na quarta-feira, 18/11, fui solicitado para "dar aula em uma sala onde não leciono" no período da manhã por falta de professor e de eventual. Na quinta fiquei novamente duas aulas de bobeira no período da manhã, enquanto os terceiros faziam a prova do Saresp.

Aliás, "fazer prova do Saresp" é uma metonímia tresloucada para "vamu imbora pessoar!". Nenhum aluno leva essa p... prova a sério. Prova que, segundo os próprios alunos, "não serve para nada" e "só tem coisa que a gente nunca viu". De fato, o Saresp sempre foi, e esse ano também, uma prova conteudista, descontextualizada e que avalia conteúdos curriculares independentemente das realidades escolares locais; o que, traduzido para o bom português, significa: "prova que avalia o que o aluno deveria saber se ele estivesse em uma escola de verdade". Razão pela qual os resultados que ela estampa são tão ruins quanto parecem.

Na sexta de manhã participei de altas negociações com os colegas do corpo docente para que eles pudessem completar os seus projetos, que exigia que os alunos participassem assistindo a uma peça de teatro, ou encenando-a, e para que eu pudesse "dar aula normalmente" para um segundo ano que quase não teve aula comigo desde que retornei de minha licença há um mês. E para fechar a sexta-feira, o terceiro ano do noturno que foi dispensado de uma aula minha na sexta-feira da semana passada (para não ser a única classe com aula na escola) resolveu dar o troco e faltar coletivamente, fazendo companhia para o resto da escola. Isso sim que é "equidade em seu maior e melhor estilo pedagógico".

Por fim, no sábado, a "reposição" foi marcada na igreja católica do bairro. É isso mesmo, vão à missa repor aulas. Infelizmente vão colocar "ausência total" na frente do meu nome no livro-ponto porque estou me recusando a participar dessa farsa chamada "reposição" desde que foi proposta, mas se eu não quisesse participar de uma missa católica (essa história de escola laica é só mais uma grande mentira) teria como alternativa ficar fazendo reparos na escola (dia de pintar o portão!). E porque não... Afinal, sou só um professor mesmo!

É engraçado como lendo tudo isso que eu relato aqui, eu mesmo me sinto como Josef K., aquele sujeito protagonista de "A Metamorfose", de Kafka. Imagino então o que os meus oito leitores não devem pensar. A "escola pública" (pelo menos "essa onde estou") é tão surreal que o mais psicodélico porra-louca dos idos de sessenta se sentiria "mó careta" se vivenciasse o que descrevo.

Curioso mesmo é ler os papers dos especialistas que tentam desvendar os mistérios da barata-pedagógica brasileira que nem Kafka seria capaz de imaginar. Também é curioso saber que esses especialistas recebem salários para isso há décadas, enquanto a escola só piora e barateia. Seriam eles insetos também?

terça-feira, 17 de novembro de 2009

A era do "Não tô nem aí"

Este post baseia-se no original que eu publiquei diretamente na seção de notícias no meu portal.

Nessa segunda-feira acabou o prazo de votação no concurso "Experiencia nota 10" do site NET Educação, onde eu havia inscrito um dos projetos que desenvolvi no ano passado.

Perdemos feio! Mas aprendemos algo com isso.

Embora o concurso não tenha analisado os projetos, apenas os colocou em votação para o público, eu cheguei mesmo a pensar que teríamos alguma chance de ganhar, pois parte do prêmio era um datashow para a escola e para votar no projeto não custava nada, bastando acessar o site do concurso e votar. A única exigência era fazer antes um breve cadastro rápido e gratuito e depois de votar confirmar o CPF (o que exige do votante que ele tenha CPF e "elimina" a possibilidade de muitos estudantes que não têm CPF votarem).

Eu divulguei o projeto na Internet, no meu site, no meu blog e em várias listas, fóruns e grupos de discussão dos quais participo. Além disso, avisei todos os meus alunos e coloquei nos corredores da escola diversos cartazes falando sobre o concurso, o prêmio, como votar e como acessar o site. Também comuniquei a gestão da escola, a coordenação, a secretaria e os colegas professores.

Bom, noves fora nada, o resultado foi que o meu projeto teve 24 votos e o projeto ganhador teve 884. Parabéns ao vencedor! E, diga-se de passagem, o projeto vencedor é um belo projeto mesmo.

Resta então apenas uma breve reflexão sobre a origem desses 24 votos... De onde terão vindo?

Entre meus amigos virtuais que disseram ter votado no meu projeto já dá para somar quase esse número. Na minha escola, entre professores, gestão e funcionários da secretaria, passamos tranquilamente desse número e, finalmente, entre meus alunos com CPF, e sem contar os demais alunos da escola para os quais não leciono, certamente teríamos muitos votos possíveis. Considerando ainda que divulguei o projeto na Internet para um público estimado de cerca de 30.000 pessoas da área de Educação, o retorno em votos foi algo como 0,001%. Nada mal!

Por fim, tomando-se em conta que o projeto era realmente bom, a causa era justa e o custo de votar nele era nulo, acho que só resta uma boa explicação para essa absoluta falta de votos: ninguém se importa. Simples assim.

Mas porque será que ninguém se importa se a grande maioria, incluindo aí os "amigos engajados", os professores e gestores da escola e, principalmente, seus alunos, vira e mexe pousam de defensores da educação, amigos da escola, etc.?

Eu vi também os resultados dos demais projetos e, com exceção do projeto ganhador e de um segundo projeto, também bastante votado, todos os demais naufragaram em cifras semelhantes ou piores que esses fatídicos 24 votos. Porque?

É compreensível que o Fulano de Tal que mora lá longe e nunca ouviu falar do autor, do projeto ou da escola, possa escolher o projeto em que votar pelo seu "gosto", mas o que dizer dos alunos, pais, professores e gestores da própria escola que concorria com o projeto?

Porque as pessoas que deveriam se importar, não se importam? Onde erramos como sociedade, como comunidade e como grupo? Ou será que a época é mesmo "a era do não tô nem aí"?

sábado, 14 de novembro de 2009

Sem tempo, sem tempo, sem tempo...

Está difícil até arrumar tempo para fofocar nesse meu blog. E o pior é que razões para fofoca não faltam. Mas todo ano é assim mesmo, nos meses finais tem sempre muita correria, muita afobação e o mesmo destino de todos os outros anos: lugar nenhum.

Nessa época já estamos pensando em fechar as notas até o final de novembro. Claro, as aulas vão até a véspera do Natal (aulas não, "dias letivos" - Santa Enganação, Batman!), mas as notas têm que estar na secretaria até o final do mês e os alunos, que são tão espertos quanto os políticos eleitos por seus pais, também sabem que depois do final de novembro só restam "dias letivos" e que faltar à escola nessa época "não dá nada não".

Nesta semana tivemos de tudo na escola. Já na terça-feira, em pleno início da quarta-aula, o apagão misterioso que pifou meu datashow e me deixou literalmente na era do "Professor Giz & Tal". Tudo bem, também sei ser professor "tecnologicamente prejudicado". Depois tivemos uma sexta-feira "emendada", consequencia do apagão educacional causado por uma excursão ao Hopi Hari que ocorre todo ano e sempre é a mesma coisa: meia dúzia de pica-paus vão brincar no parque e outros 500 matam as aulas. Mas como "não dá nada não"...

O resumo da história foi que aproveitei a sexta de manhã para buscar os datashows pifados na assistência e  para tentar recuperar um notebook desconfigurado da escola (e ainda não consegui reconfigurar o coitado - ainda bem que vem SARESP aí pela frente) e à noite, quando eu só tinha duas aulas, dei uma delas até antes do intervalo e depois a classe foi dispensada, porque se não fosse seria um absurdo 30 alunos assistindo aula de física sozinhos em uma sexta-feira à noite e o resto da escola literalmente "apagada". Será que seria um absurdo mesmo? Ou não terá sido absurdo tê-los mandado embora? Pausa para para um momento de reflexão pedagógica...

Ainda preciso confirmar com os alunos a data da palestra sobre o exame do ENEM, mas acho que estou me preocupando à toa. Os alunos dos terceiros colegiais, que deveriam ser os maiores interessados, parecem que não estão nem aí com o exame. Apesar de todos os esforços ao longo de todos esses anos, a pressão que eles recebem do "meio" é sempre maior e na cabecinha da maioria deles ainda sobrevive a idéia Aristotélica do "lugar natural de cada coisa"; a maioria ainda acredita que universidade, e principalmente se for pública e de boa qualidade, é lugar natural para ricos ou nerdes debilóides, e que o lugar deles é mesmo na sala, assistindo novela ou futebol.

Semana que vem tem SARESP e, portanto, também não tem aula nos terceiros anos (e tome dia letivo!).  Acho que teremos alunos nas outras séries (que não fazem o SARESP), mas como "não dá nada não..." talvez alguns resolvam decretar férias antecipadas também nessa semana. Enquanto isso... Em algumas salinhas fechadas, com cafezinho free e ar condicionado, pensadores refinados e altamente graduados fazem profundas reflexões pedagógicas sobre as causas do fracasso escolar... E, claro, vão concluir o de sempre. Afinal, para eles também "não dá nada não".

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

O apagão que apagou o datashow

Lá estava eu tentando ganhar tempo no curso de Física de Partículas para os alunos do 3C noturno quando... Zip! É, zip mesmo. A luz apagou, acendeu, apagou de novo, acendeu de novo e parece que os fantasmas haviam levantado das tumbas para aterrorizar a escola. Na verdade era só o "apagão" de ontem à noite (10/11/2009) que derrubou Itaipu e causou um blackout em várias regiões do país.

Obviamente no primeiro piscar de luz uma mocinha já gritou "Acabou a aula! 'Dispensa nóis', pssor!", e antes de eu dizer qualquer coisa a luz já estava de volta e firme. Para a tristeza da donzela a luz continuou firme e forte até as 23:00. :)

O problema é que enquanto acontecia o "zip", o nosso datashow fazia "zap" e daí por diante se recusaria a ligar novamente. Tenho uma vaga esperança de que seja apenas um fusível queimado, já que o outro datashow pifou na semana passada e, nesse caso, foi de "velhice" mesmo.

Com Data ou sem Data, o Show não pode parar, então vamos nós lá para lousa e bola para frente. Ou melhor, "partículas, adiante!".

Por uma grande coincidência, duas semanas antes eu havia inscrito um projeto meu de uso pedagógico das TICs na Educação no concurso "Experiência Nota 10", promovido pelo site da empresa NET, e cujo prêmio ao vencedor é um netbook e um datashow para escola. Agora torço para ganhar o prêmio e para que o segundo da tashow que pifou ontem possa ser recuperado com um custo baixo.

À propósito, vence o curso o projeto que tiver mais votos pela Internet, por isso, se quiser votar no meu projeto "a gente agradecemos".

O projeto inscrito é na verdade o curso de Física de Partículas que criei para apoiar as aulas presenciais no ano passado e que supriu a falta de material didático à respeito do assunto e permitiu atividades online usando um ambiente de aprendizagem à distância (EAD baseado em Moodle). O projeto deu certo e os alunos gostaram muito, além de que serviu como primeira aproximação dos alunos com um ambiente de EAD que provavelmente usarão futuramente em cursos e aperfeiçoamentos profissionais.

A votação para o projeto vai até 14/11 apenas. Para votar é preciso fazer o cadastro no site da NET e você pode fazer isso na mesma página onde está projeto (tem um link de cadastro na página do projeto), e também é preciso ter CPF, pois cada um só pode dar um voto.

Para acessar a página do meu projeto e conhecer sua descrição, acesse esse link.

Para ver o curso de que trata o projeto, acesse diretamente esse link e entre como "visitante" na página de login.

Nós, professores e alunos aqui da EE Neuza Nazatto, que tivemos nosso datashow "apagado", mas que  gostamos de tê-lo "acesso" regularmente, agradecemos seu voto.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

E la nave va


Às 5:30 da madrugada do domingo eu publiquei aqui no blog a notícia de que havia retornado às minhas aulas após um período de dois meses de afastamento. Ilustrei o artigo com a imagem de uma lápide onde se lê "Aqui jaz as férias, JC está de volta" (veja o artigo, vá!). Algumas horas mais tarde eu recebi a notícia de que um dos meus colegas, professor da minha escola, havia falecido: o professor Denilson (foto ao lado).

Como um soco no estômago, doeu, e como se fosse uma piada de mau gosto, demorei para entender. Mas depois a ficha caiu. Ele morreu mesmo. Enquanto eu anunciava a morte das minhas férias o tempo corria contra a vida de Denilson e, algumas horas depois, era a morte dele que estava sendo anunciada.

Aos quarenta e sete anos Denilson parecia um adolescente de 15 quando falava da vida. Ele queria muito viver. Sua gargalhada ecoava pela escola e pelos corredores. Ele até poderia não ser, mas certamente parecia feliz.

Na escola os alunos sabiam que tinham que respeitar os horários da aula do Denilson. Atrasados não entravam. Prazos tinham que ser cumpridos. E ele os fazia cumprir. Às vezes durão, às vezes nem tanto, ele era mesmo um coração mole que gostava muito de seus alunos embora não deixasse muito que isso transparecesse.

Denilson morreu em um domingo, véspera de feriado de finados, e não deixou para nós nenhum dia letivo suspenso, exceto o período da manhã da terça-feira, quando a escola lhe fez uma homenagem e suspendeu as aulas. Morreu longe, me parece que em Brotas, em um churrasco, e ninguém daqui foi ao seu enterro (que eu saiba). Os alunos vão falar da morte dele durante a semana toda, mas outro vai entrar com um punhado de giz e a História continuará, com outro professor de História. A vida continuará para todos nós, até o dia em que acabar e formos esquecidos também.

Dei carona ao Denilson muitas vezes, tive muitas conversas com ele, as vezes longas. Posso dizer que dentre os professores ele foi um dos que sempre esteve disponível para um bom papo, e falava sobre qualquer assunto, embora tivesse sempre uma grande preocupação com os assuntos relativos à Educação. Era sim um grande sujeito, apesar de todas as críticas que lhe fizeram em vida e as que farão agora, que está morto.

Acho que Denilson soube viver bem seus poucos quarenta e sete anos. Não deixa filhos, nem livros e, ao que se sabe, não plantou árvores. Mas deixa-nos outra vez uma oportunidade de reflexão sobre o quanto insignificantes somos diante da pretensão que temos de querermos ter alguma importância além da própria existência.

Fiquei triste. Mas me lembrarei das gargalhadas que demos juntos, das contas que não pagamos e de como lembrávamos mais dele em vida do que nos lembraremos agora, na morte.

Tchau Denilson. Foi um prazer ter conhecido e convivido com você o pouco que convivemos.

domingo, 1 de novembro de 2009

De volta para o passado





Não, não estou falando do título de nenhum filme não, estou falando da minha volta à sala de aula depois de um certo e incerto merecido descanso.

O retorno à escola é sempre algo emocionante: ninguém sentiu saudades, ninguém ligou, ninguém mandou flores. É óbvio, eu não morri.

Se tivesse morrido, e numa quarta-feira de manhãzinha, de preferência na própria escola, então as aulas seriam suspensas devido ao "constrangimento emocional causado aos alunos", na quinta as aulas seriam suspensas porque os professores colegas faltariam para ir ao enterro (embora fossem ao boteco e não ao cemitério) e na sexta... bem, sexta-feira nunca foi dia de aula mesmo, então emendariam. Daí sim, eu ganharia uma ridícula coroa de flores baratinha e comprada com as migalhas doadas à contragosto pelo corpo docente e amigo. Mas, para o azar de todos, estou vivo!

Descobri que nos dois meses que estive fora, a programação do meu curso "andou para trás". Yes! Parece que voltamos alguns capítulos. Seria estranho se não fosse uma verdadeira escola pública, mas aqui é normal.

Não, não adianta culpar os meus substitutos, eles fizeram o melhor que puderam. Além disso, quem se importa? Estão todos igualmente felizes e satisfeitos. Ninguém acompanha essa tal de "programação" mesmo. Currículo é só uma carta de más intenções e a aprendizagem... bom, deixa prá lá, ninguém se importa também.

Ainda estou em fase de "atualização de dados". Já sei, por exemplo, que as reposições de aula aos sábados são mesmo uma farsa como todos sabiam de antemão (mas não contem para ninguém, porque o que conta é contar os dias letivos... ops, contei!). Todos sabiam que os alunos não iriam, que os poucos que fossem seriam apenas "enrolados" (no bom sentido, é claro) e que, ao fim e ao cabo, a culpa é de quem mandou dispensar os alunos para as festas gripais de meio de ano para depois convocá-los para aulas fantasmas de final de semana. Tudo bem também, ninguém liga mesmo.

Também descobri que apenas cerca de 1% apenas dos meus alunos ainda vão para a escola levando o livro didático. Mas afinal, para "andar para trás" para que se precisa de livros? Agora vou gastar o resto do ano cobrando deles que "descubram onde enfiaram os seus livros".

Vou aproveitar a catastrofe curricular e relançar meus cursos online (EAD na plataforma Moodle) de apoio às aulas presenciais. Pelo menos assim, se os alunos não aprenderem física, eles aprenderão a aprender em um ambiente virtual de aprendizagem.

Ainda tenho cerca de um mês de aulas, ou quatro semanas, para dar conta dos conteúdos do quarto bimestre (e o que mais for preciso) e para terminar tudo e avaliar os alunos. Depois disso vem dezembro e, como sabemos, dezembro também não tem aulas, tem somente dias letivos. Puxa, como temos dias letivos! São duzentos!!! Se tivéssemos aulas em alguns deles faríamos uma revolução educacional.

Como sou um professor otimista, que acredita em duendes e discursos políticos, vamos que vamos!

sábado, 29 de agosto de 2009

Descansando um pouco

Por recomendações médicas estarei "de molho" por uns tempos. Nada que algumas noites bem dormidas e alguns comprimidos não resolvam.

Como de costume, sempre que eu me ausento alguém me substitui. E é por essa razão mesmo que há muito "desencanei" e me conformei de que ninguém é insubstituível. Como nos acostumamos a dizer na Sala dos Professores: morra numa quarta-feira, durante a aula, assim a confusão suspende as aulas do período, a direção libera os alunos para o enterro na quinta e todos emendam a sexta. Mas na segunda já virá um substituto e a vida continua para quem não morreu. :)

Essas ocasiões me levam também a refletir um pouco sobre o que entendemos por "dedicação à escola". Eu nunca gostei muito da idéia de que deva trabalhar para justificar meu salário, pois se fosse assim eu precisaria trabalhar muito pouco e muito mal. Por outro lado, hoje compreendo que o sistema hipócrita promovido nas escolas públicas brasileiras consiste realmente de uma única atividade pedagógica relevante: assinar o livro ponto.

Se você assina o livro ponto, todos ficam felizes. O que você faz depois disso, na sala de aula, ninguém vê, ninguém se importa. Quando se fala em "meritocracia" como forma de pagar diferenciadamente salários de professores, fico pensando sobre esse enorme mérito que é assinar o livro ponto... Você o assina e ganha o mérito! Assim tem sido por longos anos.

Com o advento das avaliações externas (Enem, Saresp, Saeb, Prova Brasil, etc.) começou a brotar uma nova sementinha de idéia de avaliação e meritocracia, mas ligada ao desempenho dos alunos apenas, como se esse desempenho fosse de fato uma consequencia única do trabalho do professor. Mas parece que a sementinha murchou ainda broto e o que nos resta ainda é uma nau à deriva em um oceano de turbulências.

Enfim, estarei de molho. A escola continua, os alunos estarão lá, alguém me subsituirá e ninguém se importará com o resto, pois o livro ponto continuará sendo assinado e isso continua sendo a única coisa que importa. Ah, agora também será assinado aos sábados! Nossa, que modernidade!

À propósito, continuarei postando comentários aqui, mesmo não estando na escola. Afinal, as fofocas sempre chegam por MSN e pelo Orkut.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Há males que vem para o bem, e outros que vem para piorar

Com a pandemia de pânico midiático sobre a gripe influenza A H1N1, a Secretaria da Educação de São Paulo adiou o reinício das aulas para 17/08, dispensando alguns milhares de professores e mais de uma dezena de milhões de alunos, atrasando o reinício das aulas por duas semanas apesar de o próprio Ministério da Saúde ter declarado que essa medida era inócua e desnecessária.

Durante essas duas semanas os alunos continuaram indo às baladas, se reunindo em turminhas nos fins de semana, indo a shows e eventos com imensos aglomerados de pessoas e participando das torcidas de seus times que enchem os estádios de futebol. Além disso, ficaram mais duas semanas afastados das aulas e dos professores que poderiam ter lhes passado informações úteis e importantes sobre como se prevenirem do contagio com essa nova gripe.

Já os professores, que poderiam ter ido trabalhar, mesmos sem alunos, e participar de cursos de formação, se dedicarem a um panejamento escolar de verdade e não a essa farsa que é feita em um ou dois dias por ano, onde nada se planeja de fato, estes tiveram que ficar em suas casas assistindo televisão. Evidentemente alguns professores se dedicaram a preparar suas aulas para o segundo semestre e adaptar o conteúdo de suas disciplinas a um número menor de dias letivos, conforme sugeriu um parecer do Conselho Estadual de Educação de São Paulo que afirma não ser necessário repor os dias perdidos desde que se mantenha o conteúdo programático do ano letivo.

Agora, passada a fase de tolice midiática e pânico generalizado dos desinformados mandatários da política educacional paulista, retornamos nessa semana às aulas e... pasmem, estamos todos vivos! É incrível como ninguém morreu indo a tantos shows, baladas, festas, campos de futebol, etc., e mesmo sem poder contar com nenhuma informação extra que a escola deveria fornecer e não o fez porque estava fechada.

Que certos males vem para o bem é verdade, todos sabemos. As escolas reabriram com sabão e toalha de papel nos banheiros. Incrível! Aqueles banheiros nojentos e imundos, onde nem as torneiras funcionam direito, estavam agora limpos e tinham até sabão para os alunos lavarem as mãos e papel para enxugarem-nas; coisa que há décadas eu não via em banheiros de muitas escolas públicas, que costumam ser piores do que banheiros de rodoviária. Que maravilha! 1 X 0 para a gripe!

Sobre as mesas dos professores, agora encontamos um inútil frasco de "álcool gel" para os alunos higienizarem suas mãos vez por outra. De fato ele é inútil e o "álcool gel", bem como a verba que as escolas receberam para comprá-lo, não deve durar mais do que essa primeira semana, mas mesmo assim o frasco, quem sabe, poderá servir para ser transformado em um vasinho de flores um dia desses. Aliás, o "gel" já se acabou e já se está usando álcool líquido em muitos lugares. Com um pouco de limão e açúcar, chacoalhando bem, talvez possamos espantar a gripe e a recordação do salário miserável que pinga no quinto dia útil.

Mas os males também vem para piorar. Junto com o retorno às aulas, e após o parecer do Conselho Estadual de Educação que dizia não ser necessário repor essas duas semanas de aula perdidas tolamente, bastando garantir o conteúdo do programa de cada disciplina, ao que tudo indica a Secretaria de Educação resolveu que as escolas devem "repor" essas aulas que foram obrigadas a não darem pela própria Secretaria. E querem fazer isso aos sábados!

Na verdade o discurso oficial diz que cada escola tem autonomia para fazer essa reposição como quiser e a legislação garante, de fato, essa autonomia. Mas os gestores das escolas estaduais agem, em grande parte, apenas como "paus mandados" pelas suas Diretorias de Ensino que, por sua vez, são meras extensões burocráticas da Secretaria da Educação e tem uma autonomia que vai tão longe quando a estabilidade de seus cargos de confiança. Resumindo, a Secretaria manda, a Diretoria de Ensino passa o recado adiante, como bom garoto de recados, e a direção das escolas obedece passivamente, de joelhos, porque se sente mesmo como "pobres diretores coitadinhos" que não sabem o que é ter autonomia e estão acostumados a serem mandados e não a agirem como gestores, como seus cargos pressupõem que deveriam agir.

Agora pensemos um pouco... Se não temos muitos alunos nem nas sextas-feiras, aos sábados teremos menos ainda. Temos muitos alunos que trabalham aos sábados e eles não terão o direito a essa reposição de aulas sendo, obviamente, prejudicados. Mas quem liga para os alunos?

Não bastasse isso, não temos nem mesmo funcionários da limpeza aos sábados. Porque deveríamos então ter professores e alunos? Mas quem se importa com a sujeira e com os alunos?

Professores são tratados pelo governo como peões desqualificados que ganham, literalmente, pela força física de seu trabalho braçal esfregando giz na lousa. Assim como o cortador de cana recebe por eito de cana cortada, assim como o apanhador de laranjas recebe por caixa de laranjas colhida, ou o apanhador de algodão recebe por arroba de algodão que apanha, também o professor recebe "por aula dada" (o que é quase que receber por metro de giz esfregado na lousa). Para pagar seus peões do giz e apagador o Estado lhes compra "algumas aulas" e estas são atribuidas no início do ano letivo em determinados dias e horários da semana. Se um professor perde uma aula, ele não a recebe e nem pode repô-la em outro dia, como o catador de papelão que não pegou a caixa que estava no lixo e deixa de receber porque ganha por "produção"; assim também ganha o professor.

Graças a esse sistema mediaval de trabalho, onde não existe "dedicação integral" e a cada novo governo mudam-se as regras de contratação e manutenção dos contratados, o professor "pega suas aulas" no início do ano e usa o seu tempo restante para trabalhar em algo economicamente mais digno, de forma que possa sustentar sua família e doar ao seu país e aos seus alunos aquelas horas mal remuneradas que o governo lhe paga para "dar aula". Por essa razão, muitos professores trabalham cinquenta, sessenta e até noventa horas semanais, incluindo aí as "aulas dadas" que o governo compra e os demais empregos "de verdade" que ele tem.

Quando o governo decide que o professor deve agora vir trabalhar aos sábados ele está pedindo que o professor falte do seu outro trabalho, aquele onde de fato ele ganha algum dinheiro, para vir trabalhar de graça para o Estado. Se o governo fosse amigo dos professores pode até ser que esses viessem trabalhar de boa vontade, como uma espécie de favor que se faz a um amigo, mas não é esse o caso.

Mesmo professores que não trabalham aos sábados têm outros compromissos. assim como os alunos. Muitos estudam aos sábados, apesar do governo insistentemente lhes chamar de despreparados e vagabundos. Esses professores e alunos faltarão dos cursos que fazem para vir doar seu tempo para um governo que eles nem conhecem direito e que só vêem em fotografias e na TV, na época das eleições? Será que esses gestores que "engolem" qualquer coisa que lhe enfiem goela abaixo nas Diretorias de Ensino têm um mínimo de sensibilidade para perceberem que existem pessoas nas escolas e que essas pessoas são justamente os seus professores e alunos, e que estes têm vida e atividade aos sábados? Ou será que eles se importam mais com seus "chefes" do que com a comunidade escolar?

E o professor que já tem sua carga completa e nem pode "pegar mais aulas"? Ele será obrigado a "dar mais aulas" semanalmente do que a própria legislação permite? Alguém se importa com isso? O gestor se importa com isso?

E os professores que têm família? Sim, professores, assim como os escravos de outrora, também têm família! Esses não têm direito a descanso semanal para ficar com os seus? Será que o professor preferirá deixar seus filhos largados em casa ou pelas ruas para consertar a trapalhada feita pela Secretaria da Educação ao dispensar os alunos e os professores das aulas, contra as recomendações do próprio Ministério da Saúde? Alguém se importa com as famílias dos professores ou mesmo com sua saúde? Os gestores se importam? Ou só sabem obedecer?

E porque temos mesmo que cumprir falsamente esses duzentos dias letivos se sabemos que muitos professores e alunos faltarão porque trabalham ou porque estudam nesses dias, e outros simplesmente gostam mais de sua família do que do governo? Só para dizer que houve duzentos dias letivos? E quando houve duzentos dias letivos de verdade?

Dia letivo deveria ser dia de aula, não é mesmo? E aula pressupõe a presença de professores e alunos. Porque contamos esses dias inúteis, em que as pessoas ficam assistindo TV na sala dos professores por falta de alunos e de uma política inteligente de gestão do tempo, como se fossem dias letivos? Porque até churrascos são contados como dias letivos? Ou vai me dizer que você nunca ouviu falar de professor que foi repor aula em "dia de churrasco", "feijoada" ou "festinha na escola"?

E se precisamos mesmo de tantos dias letivos, porque mesmo com um atraso de duas semanas no reinício das aulas os materiais dos alunos que estão sendo comprados a um custo de milhões de reais do contribuinte ainda nem chegaram à todas as escolas para as aulas do segundo semestre? Porque o material dos alunos do segundo bimestre só chegou nas férias, quando já estava inutilizado? Será que isso contribui para que tenhamos duzentos dias letivos? Ou será que dia letivo não é mesmo dia para se ter aula, mas tão somente para "preencher calendário" e enganar a lei?

Sabão e toalha de papel nos banheiros, e um mínimo de vergonha para disponibilizar verbas para mantê-los nas próximas semanas, quando a mídia deixar de fazer circo com a nova gripe, são coisas boas que vieram com essa pandemia de pânico irracional e talvez durem algumas semanas (dependendo da vergonha dos governantes da hora), mas a decisão de conturbar a vida de milhões de pessoas para sustentar falsamente um calendário fajuto de reposição em que não haverão aulas verdadeiras, isso é tão ruim quanto a água suja que já começam a colocar nos frasquinhos sobre a mesa do professores e querem fazer passar por "álcool "gel". Tenho cá comigo a impressão de que essa é outras daquelas decisões que nunca deveriam ter sido tomadas e que só o são porque encontram pela frente uma multidão de cabeças de gado que caminha para o lado que o chicote manda.

Haverá alguma pandemia capaz de inserir alguma inteligência nessas decisões governamentais e locais? Haverá algum vírus capaz de infectar os cérebros dos gestores das escolas e lhes fazer ver que são mais do que apenas bonequinhos de marionetes feitos para se acovardarem e se eximirem de suas responsabilidades e passarem a agir com dignidade e respeito diante da comunidade para a qual trabalham e da qual recebem seus salário mediante impostos recolhidos dela?

Eu temo que já saiba a resposta para essas perguntas... Mas não custa nada fazê-las para que fique claro que nem todos nessa escola de falsidades e mentiras compactuam com a covardia e a mediocridade. Que venha a próxima gripe!

terça-feira, 18 de agosto de 2009

A moleza acabou de acabar!

Nada mais de ficar na net até as 4 horas da madrugada em plena segunda-feira, de acordar com o cheirinho do almoço da mamãe e curtir o tédio de assistir a sessão de desenhos animados todos os dias.

É hora de voltar para a escola! Vamos curar essa ressacada de férias!

Como certamente vocês já se esqueceram até dos nomes dos seus professores, vão aqui algumas dicas para a volta às aulas:
  • Meu nome é Prof. JC, caso já tenha se esquecido, eu sou seu professor de física. Sim, existe uma disciplina chamada física e nele se aprende advinha o que? Yes, Física!
  • Não espirre em mim em hipótese alguma, muito menos nos colegas. Se estiver gripado, fique em casa e faça de conta que as férias continuam.
  • Traga o seu material (caderno, lápis, caneta e LIVRO DE FÍSICA) para a aula. Sim! Teremos aula! Incrível, não?
  • Prepare-se para prestar muita atenção, ler e escrever bastante e, de brinde, levar alguma lição para casa.
Bom retorno!

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Férias prolongadas... Atchim!

Pois é, com medo de que a nova gripe, Influenza A H1N1 (vulga "gripe suína"), devore os cérebros dos nssos pobres alunos, a Secretaria de Educação prorrogou o reinício das aulas do segundo semestre na rede pública para 17/08. Tem aluno chorando lágrimas de sangue de tanta decepção e desejo de retornar as aulas, mas fazer o que, né?

A propósito, se quiser saber um pouco mais sobre a gripe H1N1, veja o manual básico "tira dúvidas" que coloquei no meu site. E se estiver espirrando, por favor, fique longe de mim. :)

Alunos dos terceiros colegiais já podem baixar as provas simuladas do Enem e ir aproveitando esse tempo extra de férias para fazer algo realmente útil: estudar um pouco. As questões estão disponíveis na Biblioteca Digital do meu site. Também tem um artigo n0vo sobre o tema "Enem" na página incial do meu site.

Alunos com dúvidas, ou que desejarem uma orientação para estudo nesses dias de férias extra, podem entrar em contato comigo usando o Plantão de Dúvidas online do site. Ei, é sério! Ao invés de ficar por aí, dando bobeira para os vírus, aproveite para ler algo, pesquisar na Internet, assistir bons filmes e, porque não, estudar um pouco? Aliás, estudar não mata e nem é contagioso, mas a vagabundagem é altamente contagiosa e prejudicial à saúde. :)

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Fim de semestre (Yes, férias!)

O primeiro semestre já era. Aliás, já era há muito tempo. Essa história de 200 dias letivos é apenas conversa para boi dormir. Aliás, sempre foi.

Os alunos já sumiram da escola desde a semana passada e nem os pernilongos da escola a frequentarão até o dia 14/07. Claro, tem "Gincana", tem professor, tem presença na caderneta (para todos)... Só não tem alunos, e menos ainda "aulas".

No ano passado eu fiz uma estimativa do tempo real de "aula", considerando que esse tempo devesse envolver apenas as atividades de aprendizagem, ou seja, subtraindo esses "pseudo dias letivos", o tempo perdido com a burocracia inútil e com as reuniões para fazer tricô (modernamente não fazemos mais tricô com agulha e linha, fazemos "digitalmente"). O resultado foi que temos efetivamente cerca de 1/4 do tempo que é contado como "dias letivos".

No meu caso, das cerca de 80 aulas anuais de Física, sobram aproximadamente 20 aulas apenas para lidar com o "conteúdo". Totalizando isso para os três anos do Ensino Médio o resultado é ter que ensinar toda a Física Clássica e Moderna, mais as aplicações tecnológicas e os temas transversais cabíveis, em um curso de 60 aulas ou, 50 horas. Depois tem gênio se perguntado porque que os alunos aprendem tão pouco. :)

Bom, e para onde vão as 150 horas restantes que simplesmente "desaparecem"? Oficialmente elas não vão para lugar nenhum, continuam lá, "contando nos documentos" como se fossem aulas de verdade, como foi na semana passada, como está sendo nessa semana e como será na semana que vem (e na primeira, e talvez também na segunda, semana da volta às aulas, e nas quatro últimas semanas de dezembro, e nas semanas com feriados prolongados ou emendados, e no tempo perdido com reuniões, burocracia, chamadas nominais, avaliações, discussões, etc. etc.). Mas tudo bem, o que importa é que somando todo esse tempo perdido o resultado sempre será "duzentos dias letivos". :)

Boas férias!

sexta-feira, 26 de junho de 2009

Porque as coisas podem vir a funcionar

No último post talvez eu tenha deixado a falsa impressão de que, já que as coisas não funcionam sempre na escola como deveriam, então devemos nos conformar com isso. Bom, não é nada disso e, para deixar isso bem claro hoje vou falar sobre "Porque as coisas podem vir a funcionar".

Depois de mais de uma década, recebemos, enfim, novos computadores e, substituímos assim as velhas carroças por máquinas mais potentes. A foto abaixo mostra alunos usando as novas máquinas na Sala de Informática. Alguns estavam lá fazendo as minhas tarefas (no contraturno, isto é, à tarde), outros fazendo outra coisa, mas todos bem tranquilos e sem ninguém para cuidar deles. E essa situação só foi possível porque há vários anos conseguimos reabrir a Sala de Informática e colocar as tralhas velhas para funcionar. Agora nossos alunos já têm condições e autonomia para cuidarem eles mesmos da Sala de Informática e dos computadores novos.










Enquanto isso... Na sala ao lado, que serve como laboratório de ciências e "Sala de Reuniões" (pois é, e também serve de depósito de porcarias diversas de vez em quando), três alunas apresentavam para o corpo docente, em horário de HTPC, a palestra que dariam para os alunos da escola toda sobre Meio Ambiente, Reciclagem e Consumo Consciente. Uma palestra muito boa, diga-se de passagem, e que faz parte de um projeto desenvolvido multidisciplinarmente na escola. Um viva à professora de Artes que está encabeçando o projeto!










Observem que as alunas estão usando um notebook (da escola) e um datashow (da escola) e que o fazem com desenvoltura, pois há dois anos já vêm fazendo isso de forma relativamente regular em várias disciplinas. Elas poderiam estar apresentando essa palestra em qualquer lugar (em uma empresa, em um congresso ou em praça pública, pois elas o fizeram muito bem).

Observe também que alguns professores estão com seus notebooks (talvez estejam consultando o Orkut, ou batendo papo no MSN durante a palestra) e isso também ocorre cada vez mais frequentemente na sala de aula. Conseguimos implantar um sistema wireless na escola toda com recursos próprios e um pouco de criatividade e agora podemos usar nossos notebooks (comprados com nosso dinheiro próprio) e os dois datashows da escola diretamente nas salas de aula usando a Internet!

Enfim, convivemos entre o último círculo do inferno de Dante e o colo macio das Valkirias de Odin, sobre uma corda banda em que podemos pender para qualquer lado e nunca temos muita certeza sobre para qual lado estamos pendendo. Mas sobre algo podemos sim ter certeza: as opções existem!

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Porque as coisas não funcionam

Entre 19/05 e 17/06 estive afastado da escola. Retornei na quinta-feira, 18/06, para as quatro aulas matinais.

Algumas coisas são muito óbvias, mas é sempre bom enfatizá-las porque, de tão óbvias, por vezes nos passam desapercebidas:
  1. Somos bem menos importantes do que imaginamos ser. Fiquei um mês longe da escola onde tenho investido grande parte do meu tempo em caráter praticamente de "doação" e com o intuito de torná-la cada dia melhor. É fato que tenho contribuído muito para a melhoria da escola, porém, ao que parece, não fiz nenhuma falta. :)
  2. As pessoas não se importam muito umas com as outras. Não apenas não tive saudades dos meus alunos e colegas como eles também não tiveram nenhuma saudade de mim. E quem disse que deveríamos ter? A escola continua sendo um ambiente impessoal, uma instituição fria, um lugar onde se vai matar o tempo ou ganhar um salário ruim. Tanto faz.
  3. Ninguém se importa em como o trabalho é feito. Meus substitutos trabalharam pouco, renderam pouco, quase nada, e atrasaram ainda mais o já atrasado cronograma de Física. Mas ninguém se importou com isso, muito menos os alunos. E advinha só o que os meus alunos queriam no meu retorno: revisão! Sim, isso mesmo, revisão de coisa nenhuma.
Em um dos terceiros colegiais um professor contou aos alunos, durante essas minhas "férias", que eu era especialista em vestibulares. É verdade, sou mesmo. Uma aluna lembrou disso na quinta-feira, mas ela queria saber se eu os ensinaria a "chutar" para melhorar o rendimento no ENEM. Bom, eu também sei ensinar isso, mas porque será que ninguém quer aprender a aprender? Será que acreditam que vão chutar a vida a vida toda? Será que ninguém teme levar um belo chute da vida?

Em uma outra classe de terceiro ano do noturno tivemos uma "falta coletiva". Isso mesmo, todos os alunos da classe (e de outras também) resolveram faltar da escola na sexta-feira. As boas razões são muitas: é sexta-feira! Em contrapartida, minha sala do EJA estava cheia de adultos dispostos a aprenderem. Será que é uma questão de maturidade apenas? Devo esperar que os meus alunos do terceiro colegial regular retornem daqui há 30 anos para terem aulas de sexta-feira?

Descobri que os livrinhos dos alunos referente ao segundo bimestre (que começou em maio), aqueles que o governo estadual está distribuindo para melhorar a qualidade do ensino e que é visto como uma espécie de "apostila" pelos menos afortunados pedagogicamente, livrinhos esses que seriam um grande apoio aos alunos, oras vejam, chegaram na escola no final da semana passada e nem foram distribuídos ainda aos alunos! Devo distribuí-los e sugerir que façam o quê com eles? Hum, melhor não me dizerem.

A vida é divertida na escola pública. Parece um conto de fadas ao avesso. E viveram infelizes para sempre...

Bom, tem uma boa notícia pelo menos: na semana anterior eu recebi meu notebook que o governo financiou para mim em 24 parcelas sem juros (alguém acredita nisso quando as Casas Bahia faz a mesma propaganda?). Ao contrário de alguns colegas que receberam notebooks depredados (sem webcam) o meu veio aparentemente completo. Já comecei a levá-lo para comer pó de giz comigo nessa semana. Pelo menos agora já posso informatizar o resto da burocracia que ainda não estava informatizada (lista de chamada, conferência de tarefas, etc.) além do uso pedagógico com os alunos.

Semana que vem revejo os demais alunos, aplico provas (vai ser uma choradeira só), recolho e distribuo tarefas e tento avaliar o que aprenderam nesse tempo em que ficamos de férias recíprocas. Depois vem as férias e logo em seguida o ano já acabou. :)

sábado, 9 de maio de 2009

A fênix renasce

Certo dia minha diretora me perguntou porque que eu "fico dando murros em ponta de faca". Ela supõe, corretamente, que eu poderia estar ganhando muito mais dinheiro se usasse as 40 horas semanais que trabalho para a escola, e pelas quais recebo oficialmente por 25, trabalhando para a iniciativa privada, ONGs e fundações (para as quais na verdade já trabalho nos meus outros cinco "empregos").

Alguns colegas professores, e de outras áreas, também me perguntam isso de vez em quando. O que não sabem é que eu mesmo me faço essa pergunta todos os dias, e todos os dias eu encontro uma resposta diferente para "continuar dando meus murros em ponta de faca". Talvez seja por isso que sou tão persistente. Talvez eu acredite que já tendo sobrevivido 26 anos nesse meio e não tendo sido corrompido por ele, quem sabe eu consiga sobreviver mais alguns...

O fato é que a fêniz renasce para o segundo bimestre. Dom Quixote avista novos moinhos de vento e se lança contra eles para a honra e glória de sua amada Dulcinéia. E lá vamos nós, mais uma vez, outra vez, novamente.

Comecei essa semana mostrando números aos meus alunos. Eles odeiam números. Acham que são inúteis e "dão trabalho". E eles estão parcialmente corretos, pois os números dão mesmo trabalho e eu devo muito do meu trabalho a eles, de onde vem que estão errados sobre a parte da "inutilidade". Foi sobre isso que lhes falei nessa semana, ao apresentar, comentar e discutir os resultados finais do primeiro bimestre. E é sobre isso que quero falar também aqui, nessa minha nave perdida em algum lugar do universo binário dos blogs pouco lidos, mas brindados com uma audiência qualificada.

Números!

Pesquisa recente da FGV mostra aquilo que eu e muitos colegas já estamos cansados de saber: a razão maior que leva ao abandono escolar é o desinteresse do aluno pela escola. Cerca de 40% dos alunos que abandonam a escola o fazem simplesmente porque "não gostam de estudar". E, afinal de contas, porque eles deveriam gostar?

A escola é chata, tem horários rígidos que devem ser cumpridos, tem organização, hierarquia, regras e normas. Além disso, na escola tem umas pessoas chatas que insistem em "dar aula" e não deixam o aluno fazer o seu orkut-presencial em paz. Chega-se mesmo ao cúmulo de pedirem tarefa para casa! Veja que absurdo?!

Na escola os professores parecem não compreender que para se dar bem na vida basta ter sorte, que há apresentadores de TV milionários, artistas que ganham fortunas, cantores podres de rico, jogadores de futebol e corredores de fórmula 1 que nem conseguem contar o dinheiro que têm. E eles nunca falam da escola que tiveram ou não tiveram. A escola não lhes serviu para nada. Há até quem diga que o próprio Presidente da República é um apedeuta que confirma essa tese.

Não bastasse tudo isso, nossos alunos ainda assistem rotineiramente na TV (porque raramente lêm bons jornais e revistas, embora eles também publiquem isso quase todo dia) que a escola está decadente, o ensino é ruim, a escola é antiquada e, se for pública então... Aí já nem é mais escola, é pura perda de tempo, certo?

Errado! Tudo isso está ERRADO!

O que os números (sim, eles!) nos mostram é que para cada ano investido em estudo o retorno é maior do que qualquer outro investimento. Abandonar ou menosprezar a escola para trabalhar, por exemplo, gera um prejuízo imenso para a pessoa e para o país. Mas quem acredita nisso?

Não é preciso acreditar, basta olhar para eles... Os números! Eu vou reproduzir aqui um resumo do que mostrei para meus alunos (e vou usar os números para o Ensino Médio):

Um jovem que abandona a escola durante o Ensino Médio e tem, portanto, escolaridade correspondente ao Ensino Fundamental (porque somente este está completo nesse caso), tem um salário médio de R$ 604,00 (variando até R$ 847,00 para os concluintes do Ensino Médio). Com esse salário, e supondo que sempre se mantenha empregado (o que não é verdade, mas não faz muita diferença nos números finais), um jovem que abandona a escola terá recebido em salários R$ 274.820,00 até quando completar 35 anos de trabalho e (supondo que fosse possível) se aposentar, parando de trabalhar.

O mesmo Jovem, se completar o Ensino Médio, receberá no mesmo período R$ 385.385,00. Se completar o Ensino Superior, que é o objetivo que eu gostaria de despertar neles, terá ganho R$ 786.240,00 ou, R$ 511.420,00 a mais!

Ahá! Então abandonar a escola, mesmo tendo terminado o Ensino Médio, para "poder trabalhar", significa ter um prejuízo de R$ 511.420,00, ou seja, praticamente o dobro do que o sujeito ganhará abandonando a escola para trabalhar!

As "contas" podem ir muito além disso, mas não vou me estender muito nesse texto porque isso aqui ainda é um blog e blogs não são o melhor lugar do mundo para textos extensos.

Então vamos logo ao ponto: um prejuízo semelhante é o que estão tendo os nossos alunos que, mesmo não abandonando o Ensino Médio, acreditam que ele não tem importância e não se dedicam aos estudos. E esse prejuízo está sendo causado em grande parte por nós professores, pelos pais desses alunos e pela sociedade apedeuta que não lê pesquisas, relatórios e trabalhos acadêmicos sobre a educação, mas que insiste em ter uma opinião (geralmente degradante) sobre a escola.

Nas nossas salas de aula, dentre os alunos que "ainda não abandoram a escola", é lícito inferir que proporção semelhante a esses "40%" também seja de alunos que "não gostam da escola, não querem aprender e acreditam que a escola e tudo o que se ensina nela lhes será inútil". Esses alunos são altamente propensos a "desistirem já" (o que nos remete aos índices de evasão escolar de cada unidade) e resistem bravamente a qualquer metodologia de ensino, ainda que seja moderna, dinâmica e "interessante", resultando nos péssimos índices apontados pelas avaliações externas atualmente em moda. Eles simplesmente "não gostam DE escola".

Grande parte desses alunos não prosseguirá seus estudos, mesmo tendo terminado o Ensino Médio. Dos que prosseguirão, a maioria o fará trabalhando e pagando faculdades particulares (onde gastarão entre R$ 20.000,00 e R$ 100.000,00) que não lhes dará nenhuma vantagem competitiva no mercado de trabalho em relação aos alunos das faculdades públicas. Ainda que esses poucos que concluirão o Ensino Superior ganhem parte desse "meio milhão desperdiçado pela vagabundagem adolescente", aqueles que investem em seus estudos e conseguem vagas nas universidades públicas ganharão entre meio e dois milhões a mais!!!


Eu tenho cerca de 300 alunos e se eu deixar que 40% deles (120) desperdicem meio milhão cada um, terei contribuído para um prejuízo social de R$ 60.000.000,00, no mínimo! Ah claro, não serei o único culpado, etc., etc. (e segue aquele discursinho de colocar a culpa no outro), mas pelo menos estou ciente de que o meu trabalho pode gerar uma riqueza muito grande se eu conseguir convencer esses meus "pequenos artistas famosos pouco dados ao estudo" a deixarem a vagabundagem de lado e investirem em si mesmos. Não porque esse investimento traduzido em horas de estudo, tarefas feitas e atenção às aulas, seja algo que nós, os "adultos", queiramos impor a eles, mas porque isso representa algo que até o mais estúpido dos mortais compreende como importante: DINHEIRO NO BOLSO!

Voltando ao início, o segundo bimestre está começando e mais uma vez voltarei para casa todos os dias me perguntando porque não mando tudo isso à mer...cearia e vou ganhar meu dinheiro em outras pastagens... Mas, veja aí mais um motivo: se eu fizer meus alunos ganharem esses R$ 60.000.000,00, pelo menos, eu creio que parte desse dinheiro retornará para mim como benefícios naturalmente decorrentes de uma sociedade mais rica, mais produtiva, menos violenta, mais saudável e agradável. Eu não me oponho a investir também algum dinheiro meu na educação dos outros, pois a distância entre "eu" e os "outros" é muito menor do que imaginam aqueles que pensam que podem viver sozinhos em uma ilha (da fantasia).

domingo, 3 de maio de 2009

Quando um não quer...

Quando um não quer... Dois ou mais não aprendem! Ou aprendem?

Terminado o primeiro bimestre, após o conselho participativo (com professores, pais e alunos) e divulgadas as notas bimestrais e as estatísticas de cada classe, resta agora uma breve análise do primeiro bimestre.

Felizmente os problemas disciplinares estão diminuindo a cada ano e são poucos agora os alunos que apresentam disturbios e desajustes sócio-comportamentais. Claro que em algumas salas as coisas são piores que em outras, mas na média geral temos tido alguma melhora de ano para ano.

O que está no foco das atenções desde o ano passado e ainda é um problema de difícil enfrentamento é a própria qualidade da aprendizagem. E estou usando aqui o termo "aprendizagem" e não "ensino" porque o foco desta vez é no aluno, em sua família e na sua trajetória escolar.

Algumas coisas ficaram bastante claras, já nesse primeiro bimestre:
  1. Os alunos chegam cada vez piores ao Ensino Médio. Mesmo os alunos que já estão no Ensino Fundamental na própria escola tendem a chegar no Ensino Médio cada vez menos preparados;
  2. Os alunos não têm hábitos de estudo, não estudam em casa, não fazem tarefas de casa e não têm interesse por atividades no contraturno;
  3. As famílias não têm o hábito de acompanhar o desempenho escolar dos filhos, não os incentivam ao estudo, não vêem no estudo algo importante para seus filhos e não investem na educação dos mesmos;
  4. Mesmo a escola sendo uma das melhores da região em todos os indicadores externos (Saresp, Idesp e Enen), e possuindo um corpo docente na maioria estável e dedicado, fazendo uso de novas tecnologias, dinâmicas mais modernas de aula e diversas atividades interessantes para os alunos, ainda assim não conseguimos criar uma "cultura estudantil" nos alunos.
Enquanto algumas pesquisas mostram claramente a importância do estudo na vida das pessoas, a mídia as iguala por padrões de consumo. Embora cada ano a mais de escolarização signifique em média 11% a mais de salário, as famílias ainda acreditam que seus filhos devam abandonar ou menosprezar a escola e iniciar no mercado de trabalho aos 14 anos. Mesmo sabendo que é possível concorrer em universidades públicas, nossos alunos ainda planejam trabalhar e juntar dinheiro para pagar faculdades particulares. É a pobreza em sua face mais perversa: a miséria dos sonhos pequenos.

Nessa próxima semana minha tarefa será divulgar as notas bimestrais, comentar as avaliações e, mais uma vez, tentar convencer os meus alunos de que eles são muito melhores do que a imagem que têm de si mesmos, que podem muito mais do que seus pais puderam e que o único limite que têm que superar é sua própria pobreza de sonhos. Vamos lá então...

terça-feira, 21 de abril de 2009

Uma sangria desatada

"Sangria desatada", para os newbies vernaculares da nova pós-ortografia luso-tupiniquim, significa "muito sangue". No contexto desse texto (até rimou!) significa uma enorme "vermelhidão". É claro, estou falando das notas das provas bimestrais.


Olhando aqui para minha planilha de notas, ainda não finalizada, vejo uma gigantesca mancha vermelha e uma ou outra ilhota mais azulada.

O diagnóstico não poderia ser mais óbvio: fracassamos!

Todos nós, pais, professores, ex-professores, alunos, coordenação, gestão e até mesmo nossos governantes (tadinhos deles), compartilham comigo essa tristeza e essa amarga sensação de "fracasso".

Não há culpados, é claro. Em um sistema em que ninguém faz sua parte como deveria, onde todos têm suas múltiplas culpas, culpar um ou outro é mero exercício de "empurrismo".

As notas vermelhas que escorrem dessa planilha não são forjadas, não estão aí para se prestarem à geração de estatísticas "esquisitas". Essas notas refletem uma realidade que muitos gostam de fazer de conta que será fácil mudar. Outros preferem simplesmente negar a realidade e "maquiar" os números. Assim tem sido, e por ter sido assim é que essa planilha traz estampada o rubor que muitos não têm na face. Mas deveriam...

Como pode minha escola ser uma das melhores da cidade e da região se tenho alunos que não sabem ler, raramente lêm alguma coisa, não compreendem quando lêm e, quando compreendem, não são capazes de expressar essa compreensão? Como posso ser um dos "professores abonados" (sim, superamos as metas para além do máximo!) se meus alunos não sabem somar números negativos, não conseguem calcular 10% de qualquer coisa, se descabelam diante de um "x" e tremem diante de uma equação do primeiro grau?

Hummm... Talvez a culpa seja minha... Mas espere aí, leia antes o meu currículo! Lá você verá que eu tenho culpa sim, mas deve ser bem menor que a sua culpa, que aparentemente nem tem nada a ver com isso. :)

Esqueçamos os culpados, todos nós o somos, e concentremo-nos nas soluções:
1 - convencer pais e responsáveis de que a escola é só uma parte do processo de educação de seus filhos e que, portanto, a "escola" se estende para a casa do aluno da mesma forma como a "casa do aluno" se estende para a escola;
2 - alfabetizar, sim, isso mesmo, alfabetizar esses moços e moças que tropeçam em proparoxítonas, desconhecem concordância mas, pior que tudo, não compreendem um parágrafo sequer daquilo que lêem;
3 - ensinar a eles a velha e boa tabuada que lhes permite dizer quanto é 8 X 7 sem precisarem de uma calculadora e, se possível, ensinar-lhes a somar, subtrair, multiplicar e dividir. Eu sei que parece ridículo, mas é mesmo ridículo!
4 - reconstruir a escola instituição-de-ensino em substituição à escola Orkut-presencial, sem excluir, sem segregar e baseada em um modelo humanista, pragmático e científico;
5 - rebelar-se contra a mediocridade reinante, a preguiça política na entresafra eleitoral, a hipocrisia hierárquica de "burocratas de confiança" e colocar as mãos na massa, o giz na lousa ou o bit no datashow.

É triste um país que assassina o futuro de seus jovens. É triste uma escola de mentirinha para "uns" e um mundo verdadeiro e competitivo que só aceita os "outros". É triste, é doído e é verdadeiro.

Meus alunos são adolescentes inteligentes, sadios, bem vestidos e bem alimentados. Estudam em uma das melhores escolas da região e dispõem de recurso que dão inveja a muitas escolas da rede particular. Eles têm bons professores, bons livros e boas oportunidades... Não parece certo que os abandonemos agora, para culpá-los depois. Não parece certo que tenham permanecido na escola até hoje, por cerca de 10 anos, e que não tenham aprendido quase nada.

As notas finais ficarão mais "azuis", pois meu critério de formação de notas inclui muitos outros itens além das notas de provas. A extrema maioria deles será aprovada e eu não me oponho a isso. No final, parecerá que tudo terminou bem... Mas não é bem assim.

Daqui há uns poucos anos eles estarão trabalhando duro para pagar uma faculdade vagabunda financiada por algum programa assistencialista (e necessário). Poucos conseguirão bons empregos. Raríssimos chegarão a uma pós-graduação ou mesmo a uma profissão liberal com boas chances de ascenção social. E isso está muito errado!

É por essas e outras que muitos professores simplesmente "desistem diante dos obstáculos intransponíveis". Talvez estejam certos. Infelizmente, ou felizmente, me identifico bastante com o personagem de Cervantes que lutava contra moinhos de vento em busca de sua mui garbosa e nunca vista Dulcinéia.

Que venha o próximo bimestre!

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Rebelião estudantil no 3º colegial

Na quinta-feira da semana passada, 02/04, aconteceu a primeira rebelião pedagógica do ano em um dos meus terceiros colegiais. Eu não poderia deixar de contar aqui esse fato tão incomum e dar, é claro, a minha versão sobre ele. O espaço para comentários está aberto para quem tiver uma opinião diferente.

Tudo começou com o fato de que nesse ano os alunos receberam pela primeira vez, depois de mais de uma década, livros didáticos de Física. Aquilo que, de fato, é um imenso ganho pedagógico e nos possibilita ganhar em tempo, qualidade e eficiência, pelo menos do ponto de vista do professor, é para os alunos uma enorme dor de cabeça.

Ter um livro didático implica em também trazê-lo para a escola em todas as aulas, e isso já parece absurdo para muitos alunos. Na verdade, nem é tão incomum encontrarmos alunos que vêm para a escola e não trazem sequer um caderno e uma caneta. Parece absurdo, mas é assim mesmo que acontece às vezes. Isso deve-se ao fato de que para muitos desses alunos a escola tornou-se apenas e tão somente um Orkut Presencial, frase que cunhei em um comentário que fiz em um artigo publicado pela revista Seleções de março passado.

Mas não basta trazer o livro para a escola, é também necessário que o aluno utilize o livro em sua casa! Sim! Sim! Sim! O livro didático serve para estudar. E estudar é tudo o que muitos desses meninos e meninas não têm feito nos últimos dez anos. É claro que a culpa não é só deles, pois não tendo livros para estudar e, não sendo levados a estudar nas disciplinas que tinham livros, é natural que pareça estranho ter que ler, reler, estudar, fazer tarefas, resumos e anotações.

Pois bem, nessa quinta-feira fui surpreendido (?) com uma inusitada rebelião de alunos que, com toda razão, na visão deles, estão sendo obrigados a lerem e estudarem com seus livros. A queixa soa justa: o professor deveria primeiro explicar o texto e, somente depois, solicitar que os alunos fizessem algo a partir do texto. Na verdade o que eu tenho feito não é mesmo assim, pois primeiro os alunos são solicitados a lerem e estudar os textos, então devem tentar resolver os problemas e, depois disso, o professor faz observações sobre o texto, comenta os problemas, explica o assunto onde há mais dificuldade e resolve alguns problemas que os alunos não conseguiram resolver.

Isso parece muito estranho para os alunos, mas mais estranho ainda é imaginarmos que o método que eles julgam correto, e que foi usado extensivamente com eles no ensino fundamental sem obter resultados significativos, fosse empregado no dia a dia deles. Imagine que você vá a uma banca de revistas e compre uma revista, então o jornaleiro senta-se ao seu lado e lê a revista para você, explicando as notícias, e somente depois disso você estará habilitado a levar a revista para casa para lê-la sozinho. Não parece algo estranho? Pois é, e é assim mesmo que a escola tem feito em muitas oportunidades. O resultado obtido é uma massa de alunos que simplesmente não consegue ler um texto e obter alguma compreensão dele.

Se por um lado "parece injusto" querer agora, bem no Ensino Médio, quando os pequeninos já estão crescidinhos, querer que eles adquiram habilidades de leitura e compreensão, que lhes permitam mais autonomia de aprendizagem, por outro, a pergunta é: então devemos simplesmente cuspi-los da escola analfabetos-funcionais só porque hoje, em pleno Ensino Médio, eles se encontram nesse estado?

A rebelião que eu assisti, e que muitos professores também devem assistir em circunstâncias parecidas, é uma das provas fósseis mais significativas da ineficácia de um ensino baseado em "aulas expositivas de conteúdo", onde o professor literalmente "lê o livro para os alunos", resolve um ou dois problemas simples e propõe um dois problemas idênticos para que resolvam. Todos ficam felizes, e todos saem analfabetos da escola mais tarde.

Bom, eu sufoquei a rebelião. Fiz valer o pressuposto de que eu sei melhor do que meus alunos qual é a melhor metodologia a ser usada, mas confesso que fiquei triste. Eles são honestos em suas reinvidicações, estão ansiosos com as provas, sentem a enorme dificuldade que a leitura e o estudo representa para eles e, ao fim e ao cabo, tudo o que queriam é aquilo que a escola já vem dando a eles há mais de uma década: um ensino para macacos.

Ora bolas! Meus alunos não são macacos! Eles merecem mais do que se tornarem apenas números sem sentido em estatísticas aleijadas sobre a educação. Eles merecem muito mais e, pelo menos, merecem adquirir a capacidade de aprenderem com autonomia, indentificarem as próprias dificuldades e compreenderem os meios pelos quais podem superar essas dificuldades. Abaixo a rebelião! Avante a Educação!

domingo, 29 de março de 2009

A "Grande Chefa" pediu a conta

Na última sexta-feira, 27/03, após cerca de um ano e meio no cargo, e num dia em que os professores passaram o dia todo reclamando de seus "bônus por mérito" (divulgado nesse dia), a Secretária da Educação de São Paulo, minha "Chefa-Mor", Maria Helena Guimarães, pediu a conta (ou o governador pediu a conta dela, tanto faz).

Até 15/03 ela continua no cargo, enquanto o seu substituto, ex-ministro da Educação de FHC, Paulo Renato, faz seus preparativos para assumir. Parece estranho esse negócio de anunciar demissão com 15 dias de aviso prévio, mas o que não parece estranho nessa história toda?

Maria Helena "liquidou" com a política "paz, amor e vagabundagem", do ex-secretário Chalita, e implantou uma política voltada a resultados, cumprimento de metas e de um currículo mínimo que nunca será cumprido. Teve lá seu lado bom, e teve também seu lado ruim. É cedo para pesar na balança e tirar conclusões definitivas.

A crescente resistência à sua política educacional e os seguidos "furos" e "trapalhadas" resultantes da implantação dessa política, parece que acabaram minando sua secretaria e lhe tirando o emprego. No fundo ela deve estar aliviada: a educação paulista é mesmo de tirar o sono de qualquer um.

Para Maria Helena talvez isso signifique sua aposentadoria, para Paulo Renato provavelmente significa garantir novamente o Ministério da Educação se, José Serra, atual governador, vier a ganhar as eleições de 2010. Para mim, como professor que vem vivendo sob a política educacional tucana há quase uma década e meia, acredito que não mude nada.